quinta-feira, julho 31, 2003

O mundo é mulato
Toco cânticos de louvor para um grupo de cerca de vinte pessoas, na sua maioria acima dos 50 anos, com uma guitarra Fender.
A natureza antes do século XX
Lição da reunião de oração da Igreja Baptista de Moscavide desta quinta-feira: as andorinhas cooperam com Deus. Sem precisar da ajuda da Greenpeace, presumo.
Recusando a ideia de castigo
Amanhã espera-me uma ida ao Algarve e posterior regresso. No 1 de Agosto semelhante viagem torna-se uma peregrinação, a suprema procura da alteridade. Levinas concordaria comigo.
Aleluias sem divindade
Vejo no canal Mezzo (ou Muzzik) um grupo provavelmente paquistanês de sufi. Gosto muito do Nusrat Fateh Ali Khan. Mas angustia-me que as liturgias musico-religiosas dos povos bárbaros sirvam para efeitos de fruição estética des-sacralizada dos ocidentais. Os incrédulos europeus só vão à igreja quando há um grupo de gospel no Festival de Jazz de Montreux.
No divã
A minha amiga M. conclui que eu escrevo partindo do princípio que os meus leitores não têm fé. Nunca tinha pensado nisso. Será o complexo de Ninive?
Por que sou cristão (ou uma rápida resposta a Russell)
Saio de um restaurante hare krishna e leio à saída "Para manter a harmonia não bata com a porta".

quarta-feira, julho 30, 2003

Peito sem crucifixo
Ulcera-me um homem que passa por mim com uma t-shirt que diz "Born to be bad". Compreendo as conveniências do laicismo mas deve haver limites.
A fragrância de Matusalém
Hoje experimentei equivocamente uma água de colónia que reputo de quarentão. Há cheiros que nos acrescentam anos. Assim como anos que nos acrescentam cheiros.
Subterrâneo
No circuito do metro há dias que são a estação da Avenida.
Sul
As Terras do Nunca inspiram-se na Voz, entre outras referências, para uma inteligente alusão ao tremor de terra mais sentido no Algarve.
Mas quem suportará o dia da sua vinda?
Chris Barnes tem o timbre de um Malaquias. Há uma destruição que se aproxima. Sinto um crescente fervor religioso quando a grafonola entrega um disco como The Bleeding dos Cannibal Corpse.
Marcas geracionais
V. era no sexto ano um rebelde sem causa. Envergava um colete ganga com inscrições de Motorhead em destaque. Tinha problemas de aproveitamento escolar e com 12 anos já fumava.
Confirmo que o meu amigo Paulo adormece o seu filho de quase dois meses ao som do Fear Of The Dark.
A diferença é 1988 e 2003.
Desejo da alma
Eu queria ser um early morning blog.

segunda-feira, julho 28, 2003

Contributo único para o metabloguismo
À semelhança do Pedro, não exerço o dom da caridade para este peditório. Resumo-me às palavras de Montaigne: "Dou conta de um inesperado proveito da publicação dos meus costumes: é que de algum modo ela me serve de regra. Vem-me, às vezes, à mente a ideia de não atraiçoar a história da minha vida. A minha declaração pública obriga-me a manter-me na minha via e a não desmentir a imagem das minhas qualidades, habitualmente menos desfiguradas e contraditas do que supõem os maliciosos e mórbidos juízos dos dias de hoje".
Nota vermelha
Reconheço que quando me defrontei com Odete Santos não a vi como uma ímpia Jezabel. Pelo contrário. Algo de sexual sustentou aquele encontro. Leonard Cohen descreve-o com precisão em "O jogo preferido":
- Sabes por que gosto de mulheres comunistas? (...) Gosto delas porque não acreditam no mundo.
Vista telescopicamente narcisista
O Canal 1 ofereceu-me o meu devido frame de fama.
Apertos
Andrew Sullivan impacienta-se com os WEPs (white evangelical protestants). Eu, como bom branco-evangélico-protestante, também perco frequentemente a paciência com os meus caros irmãos. Mas parte do charme dos evangélicos é o seu ainda-alheamento do discurso coca-colizante das harmonias cósmicas. São como uma peça de roupa interior ligeiramente apertada: ocasionalmente incómodos mas rigorosos no asseio.
Pernas esticadas
Poucos dias após ter referido a sua interpretação teledirigida da realidade, Ruben de Carvalho vem demonstrar um surpreendente relativismo cultural. Percebe-se que Cuba, como locus amenus ideologico-turístico dos comunistas, permita relaxamentos inesperados.
Tomara que para cada Rei desnorteado houvesse uma Rainha destas
O estimado Aviz escreve sobre o Livro de Ester. Obrigatório.
Jerusalém
Não há urbes credíveis sem locais recatados para forcas privadas. Por isso tem sido chamado aquele campo, até o dia de hoje, Campo de Sangue (Mateus 27:8).
Poste minimal para descrentes
Vem aí o Anjo que mata os primogénitos. Depressa, todos a besuntar sangue de cordeiro na porta!
Pass it on
A sequência "One Drop" seguida do "Ride Natty Ride" é perfeita. A capa do Survival é aquele clássico: colecciona as bandeiras das nações africanas. Sobre este preto o Clinton já não fala.
Vinho
Sábado após um almoço bem regado ocorreu-me uma ideia bestial para um poste. Desvaneceu-se-me. Existe um potencial bloguístico considerável em cada reunião dos Alcoólicos Anónimos.
Domingo
O que inspira a Voz aos domingos: uma leitura integral do Livro de Ester, o visionamento desordenado das biografias iconográficas da VH1, o artigo de Rui Ramos no Independente e o rescaldo de uma pregação em português tremido de luso-descendente. Por todas estas razões Hegel estava errado.

sábado, julho 26, 2003

Missão
A Voz do Deserto prega este fim-de-semana junto aos cidadãos incrédulos do Alentejo. Voltamos com balanços evangelísticos lá para Domingo à noite.

quinta-feira, julho 24, 2003

Turismos
A bem do equilíbrio do meu sentido estético-moral não passa um mês sem que ouça um dos dois discos do Variações. Depois, remeto-me a um período de nojo no qual choro de saudades do passado. São horas carpideiras como estas que aumentam a imagem folclórica do nosso país lá fora (os anglófonos peçam ajuda ao Gilberto Gil).
Blogues apócrifos
O Tomara-que-caia é de meninas. Duas delas amigas. Eu considero-o clarividentemente feminino. O McMenu é de um amigo adolescente que enquanto consome na multinacional (apetência gastronómica que partilho com ele) contempla o mundo fora da montra. E a Deusa do Blog, tardia mas bela idolatria.
Oráculo musical
Em cima da secretária estão quatro discos: o Jobim do Jobim, o Leave Home dos Ramones, o Babylon By Bus do Marley e o I'm Your Man do Cohen. O brasileiro, o americano e o jamaicano morreram. Sobra o judeu.
Reverente perante a tradução III
O que faz uma pessoa quando vê que as suas duas gatas se atiraram aos ímanes que estão no frigorífico? Apanha-os do chão e procura o tal estado primordial cosmicamente inalcançável.
Reverente perante a tradução II
O homem é um ser-para-a-condenação desde o Génesis. Por isso a sua Salvação não fala do seu talento pessoal mas do escandaloso perdão de Deus. O livre-arbítrio parece-me um eufemismo, um natal é sempre que o homem quer, uma trôpega conveniência social. Judas fez o que tinha a fazer. O mestre até o apressou na tarefa.
Este tipo de coisas não nos estão reveladas. Falemos do último disco da Carla Bruni.
Reverente perante a tradução
O que diz o cristianismo: o homem é um traidor. Todo ele e sem excepção. Por isso carece da graça de Deus. A salvação fala primeiro de culpa, não de mérito. Sabemos que não é simpático afirmarmos isto. Se hoje conhecesse a Maria José Nogueira Pinto (a mulher mais bonita de Portugal a seguir à minha esposa) não me ficava bem dizer-lhe que ela é, por natureza, merecedora do inferno. Estas verdades bíblicas não atiramos à cara das pessoas. O cristão deve dizer que o seu semelhante vai para o diabo que o carregue se não tratar do assunto da sua alma. Mas de uma forma simpática.
Promessa
Amanhã tentarei reponder a um desafio colocado por um dos melhores blogues que conheço - a Tradução Simultânea. Deixo-vos a minha paz.
Aleluia!
O melhor da blogosfera são as pessoas. Que lemos e de repente conhecemos. Que fique clara a minha gratidão. Parece que saí de um momento de louvor de uma Assembleia de Deus.

quarta-feira, julho 23, 2003

Alter
O Animal reflecte, no meio de um rufo na tarola, sobre religiões e afins. Sugere uma actualização na iconografia cristã: a cruz passar a cadeira eléctrica. Em Dezembro de 1999 escrevi um texto para um programa (religioso) de televisão que usava essa figura. Foi-me censurado.
Desde essa altura que sou um funcionário obediente à luz do dia e um truculento ciberprofeta nas horas de trevas.
Referência
O estimado Luís Rei escreve sobre o meu disco nas Crónicas da Terra.
História
Diz o Prof. Dr. Jónatas Machado: "Os cátaros eram uma espécie de quakers da idade média". Mas sem tremeliques. Os franceses deixaram os espasmos para o Novo Mundo.
Nomes
Há uma reverência sábia nas crianças quando nos respondem o seu nome. Numa vertigem cospem quatro ou cinco palavras pelas quais vão aprendendo o bruto conceito de identidade. Qual Derrida, qual Wittgenstein! A minha alma contorcia-se menos quando dizia "Tiago Daniel de Oliveira Marques Cavaco" em menos de dois segundos.
Não-exclusividades
Diz o tragicamente culto Manuel Maria Carrilho que "o Brasil de hoje, em toda a sua expressividade cultural e política, é uma referência da esquerda intelectual". Devo acrescentar que da minha direita também. O RDP Vivo é o disco da minha vida.
Política
Assisto a uma conferência em que o palestrante disserta sobre as virtudes do voto popular. À entrada, o zelador das instalações ouve um rádio fanhoso que bolsa Aerosmith e suspira pelo fim da prelecção. Deve ter pressa para chegar a casa. Esta é a democracia na qual creio.

segunda-feira, julho 21, 2003

Bifurcações II
Volta e meia filmo as aventuras filantrópicas das igrejas evangélicas. Por mais que se nos arrepie o couro cabeludo semiótico, qualquer pessoa que estende a mão a outro o faz num acto de proselitismo (o que lhe parece, caro Francisco?). Quem tanto deseja por aqui uma Nova Jerusalém acaba, na melhor das hipóteses, por alcançar uma Badajoz de sacristia.
Bifurcações
Por obrigações profissionais estive esta tarde na Zona J de Chelas. Descobri que o conceito arquitectónico é inspirado em Jorge Luis Borges e na sua visão da Biblioteca de Babel. Só que no lugar dos livros no labirinto estão os indígenas, com murmurações mui-pouco literárias. Reconheçamos que investir pelas vias infinitas daquele Oriente de câmara de televisão em punho é um acto kantiano de imprudência.
Esperança
Escreve o estimado Latinista Ilustre: "noto que na blogosfera existe um filosemitismo que, nas publicações impressas, parece não existir em Portugal". Subitamente parece que os nossos pecados seculares podem ser expiados através de um clique na palavra post.
A Revelação não é só para os judeus
Abundam os blogues analíticos. Bem-vindos sejam! Menos dados a erecções, são como o Evangelho de Lucas. Detalhados, prudentes e, inquestionavelmente, escritos para gentios.
Efeméride
Como bom suburbano de classe média que sou, dancei há um ano atrás uma valsa matrimonial. Escolhi o "Take This Waltz" do Cohen.
And I'll bury my soul in a scrapbook,
With the photographs there, and the moss
And I'll yield to the flood of your beauty
My cheap violin and my cross
.
Um ano depois dançamos melhor.
Correspondência
O estimado leitor João Raposo escreve-nos pouco mas bem: "Nunca deixa de me surpreender a pretensão dos homens que negam Deus. Nunca deixa de me surpreender a pretensão dos homens que afirmam Deus". Na sua ousadia Pascal resumiu a nossa atitude perante a existência de Deus a uma partida. Uma aposta pretensiosamente obrigatória.
Acerca do mal
O problema de grande parte da esquerda, personificada nessa figura quixotesca que é Ruben de Carvalho, é acreditar que é possível comer pão sem fazer migalhas. Que os incêndios não podem ter origem criminosa em distritos de expressão eleitoral comunista.

sexta-feira, julho 18, 2003

E um bom fim-de-semana!
Aproveitando o embalo dado pelo Francisco José Viegas, marquemos uma passagem onde as Escrituras mostram o esplendor do humor judeu do Deus cristão. Depois disto, voltamos domingo à noite ou segunda.
Quando todos se seduzem por um qualquer ídolo pagão é altura de imitar Elias: "invocaram o nome de Baal, desde a manhã até o meio-dia, dizendo: Ah Baal, responde-nos! Porém não houve voz; ninguém respondeu. E saltavam em volta do altar que tinham feito. Sucedeu que, ao meio-dia, Elias zombava deles, dizendo: Clamai em altas vozes, porque ele é um deus; pode ser que esteja falando, ou que tenha alguma coisa que fazer, ou que intente alguma viagem; talvez esteja dormindo, e necessite de que o acordem" (I Reis 18:26,27).
Quando não fechamos os olhos de uma forma modesta as nossas preces são avaliadas pelo grau dos decibéis.
Os lobos e o rebanhos
Chega-nos, via Aviz, a notícia de um pastor dinamarquês que foi despedido por dizer que não existe Deus. Para aqueles que não encontram conforto nas grandes narrativas explicativas (o meu caso, embora o raciocínio folclórico mande associar à religião a presunção de segurança e dúvidas respondidas) uma visão contratualizada das relações entre os humanos é o negócio mais razoável. Porque não há melhores. A minha fé inspira-me a trabalhar no provisório.
No dia em que a Igreja Baptista de Moscavide me ouça enumerar as virtudes do Dalai Lama, que me mande pregar noutra freguesia.
A ordem das coisas
Os americanos, convencidos que o diabo nos anos setenta havia arrebatado para si a música popular, criaram a Contemporary Christian Music. Os europeus, gente muito sóbria e racional, fazem documentários sobre aquilo que os americanos inventam.
Um pequeno relato de uma história de amor
Há um ano atrás uma sardinhada comemorava a permissão que a lei me dava para ser um homem casado. Os pratos falam das pessoas que os comem.
Semi-obscenidade sobre ecumenismos linguísticos
A única coisa que gosto de comer saloio é o pão.
Num dos elevadores de Babel sou incomodado por um estrangeiro
O Hardblog parece ter ficado arreliado pela minha surpresa com o português correcto do David Fonseca. Meu estimado leitor, música portuguesa é uma abstracção e eu não passo muito tempo a discursar sobre estados gasosos. O facto de me invocar os Xutos, Veloso e Abrunhosa enquanto soldados do outro lado da barricada só prova que esta é uma guerra civil sua. Para pegar em armas preciso de valores mais elevados. Concerteza que considero uma imbecilidade uma banda portuguesa cantar em inglês. Custa-me a crer que o meu caro interlocutor ainda necessite de razões para entender semelhante tolice. Talvez se eu tentar argumentar noutro idioma...
Às vezes Deus fala através de ateus empedernidos
No Blog Sobre Kleist: "O que livros como "The Bible Code" revelam é que a vontade do ser humano em acreditar, conjugada com a sedução do jargão pseudocientífico e com a apetência para descobrir padrões no meio do caos (que é uma das mais fascinantes características da cognição humana) levam a extremos de credulidade preocupantes".
Amén, irmão! No dia em que as Escrituras se tornarem nas palavras-cruzadas do Correio da Manhã eu torno-me um socialista dialéctico.
E a economia de mercado continua a funcionar
O True Colors da Cyndi Lauper por menos de 5 euros.
Pai de verde mas vermelho
O pai de Bruce Banner é, sem dúvida, de esquerda.

quinta-feira, julho 17, 2003

Retrato
Ouço a Marisa Monte. O rosto da artista na capa do disco "Memórias, crônicas e declarações de amor" faz-me lembrar o da Maria (não confundir com a mãe de Jesus) que ouvia o Mestre, desatenta ao trabalho doméstico que atarefava a sua irmã Marta (Lucas 10:39-42). As pessoas ou se demoram com as urgências da sobrevivência ou se perdem nas palavras do Messias. Não há lugares intermédios.
Eléctrico
"É o narcisismo que atrai os criadores de blogues que já escrevem noutros espaços". O alegado autor desta frase e caro antigo professor desta humilde Voz do Deserto está agora aqui.
Verdade atmosférica
Não há países sérios com climas amenos.
Não entendendo tanto barulho acerca do maluco na tv
Mas o Herman já não vive sob uma suspensão temporária da moralidade?
Contentamento
Uma das minhas vontades ocultas no contexto do universo bloguístico era ser incluído na lista da Papoila. Sou susceptível a mulheres de maternidade furiosa.

terça-feira, julho 15, 2003

Quando involuntariamente crio heróis da fé
Os leitores já conhecem a minha dificuldade em lidar com jornalistas. Voltam a dizer-me que o meu português é incorrecto para fins televisivos. Demasiado erudito. Sinto-me qual verdugo de Estevão. Frases pesadas como pedras a rasgar a carne martirizada dos crentes no Caminho audiovisual.
Comidas
Em Oeiras há um estabelecimento comercial próximo da Estação que oferece uma alimentação ecologicamente inofensiva. A par, disponibiliza "actividades culturais alternativas". A clientela entra e sai com um ar satisfeito. Os velhos pequenos empresários hoteleiros que se acautelem com os novos parceiros de inspiração budista. Esta gente começa a provar que um outro mundo é possível: o prazer deixou de estar na carne.
Surpresa
Numa loja de instrumentos musicais experimento uma guitarra. Entra o David Fonseca. Para espanto meu dirige-se ao empregado usando um português correctíssimo.
Acerca dos textos sombrios do Escala-Estantes
Conheço bem essa pressão pseudo-optimista da cultura evangélica para que tudo o que sai da nossa boca/pena edifique. O problema está na compreensão do termo edificar. As muralhas de Jericó foram derrubadas de uma forma ainda mais pavorosa que a das armas. Pelo som. A visão técnica da moralidade é uma herança pesada que carregamos. Alimenta os pregadores fundamentalistas e os Louçãs das utopias. Difícil é ter na nossa boca as palavras de Job: "receberemos de Deus o bem, e não receberemos o mal?" (Job 2:10).
Sei quem em dia de Bastilhas isto pode ser intragável para os estomâgos sensíveis dos ateus. Peço desculpa. Sigam o quanto antes para os arcos-íris do Fórum Social.
A ver
Descoberta recente: o Ironista Liberal.

segunda-feira, julho 14, 2003

Provocação santa
Quando o diabo atormentava Martinho Lutero, o frade alemão atirava-lhe o tinteiro à cabeça. Deixou o seu quarto cheio de manchas na parede. E a prova que os protestantes são mais dados à literatura que os católicos.
Íntima vontade
Este blogue deseja estar para o ciber-universo como os Brujeria estão para o metal.
Nota estival
Por vezes o verão é pouco mais do que fugir dos aspersores.

domingo, julho 13, 2003

Sequência
Após ouvir o "Fame" do Bowie apetece-me citar Guitton: "E eis porque as velhas sociedades eram desculpáveis ao guiarem a escolha dos jovens, fundando-se no sentimento das conveniências, no conhecimento do meio e das convicções, na intuição das afinidades duradoiras e crescentes".
Aleluia
E ao terceiro dia o Escala-Estantes regressou.
Tricot
Escreve-nos a amiga Raquel Heleno. A natureza das relações afectivas em quatro linhas. Efectivamente é nas inevitabilidades que parece entretecer-se o caminho. Depois da puberdade interessa mais a contenção do que o vinho enganador da liberdade.
Domingo na blogosfera II
Parece-me que as verdadeiras questões morais, as que dividem os homens, são aquelas que o Pedro Lomba refere no seu poste "Somos bons, somos de esquerda". Quem passa à frente no multibanco pode ser um exemplo evangélico por excelência. Quando a religião se faz de grandes projectos tanto pode ser de Deus como do diabo.
Domingo na blogosfera
Desta vez é Pacheco Pereira que se atira à Palavra. Com muito interesse. Pedro serve de mote (nós, os protestantes, deixamos o "São" para a primeira pessoa do plural do presente do indicativo do verbo ser).

sábado, julho 12, 2003

Amén!
Um pastor pentecostal à antiga faz milagres, expulsa demónios, fala línguas, tem uma vida sexual activa e ouve Deus a falar-lhe. Coisas que não se conseguem ver em painéis iconográficos católicos.
Amén?
Ontem conheci um pastor pentecostal da velha guarda. Tendo em conta a ignorância nacional sobre o tema o melhor é lembrar Robert Duvall em "O Apóstolo". Tristes portugueses que o que pouco sabem de religião aprendem nos filmes americanos.
Placentas
É uma vantagem ser irmão gémeo de uma menina. Numa idade em que os meus amigos se esforçavam para entender as raparigas eu já tinha desistido.
Mais
Bem-vindos: Confessionário (estou muito ecuménico hoje) e Incongruências (já cá anda há algum tempo mas só recentemente o conheci).

sexta-feira, julho 11, 2003

Sobre a família
É costume ouvir dizer que os conservadores defendem o conceito de família ad absurdum. Não é certo. Por exemplo, tomemos o caso de José H., brasileiro emigrado em Portugal. Deixou mulher e filho em Vera Cruz. Frequenta a Igreja Baptista da Portela de Sacavém. A congregação acarinha-o e auxilia nas provações materiais frequentes. Apoia a sua vontade de cá reunir a sua casa. Após mais de um ano consegue-o. Acontece que a sua mulher é ímpia. Não crê como seu marido. José H. leva os seus uma singela vez à Casa de Oração. Depois desaparece do contacto da comunidade.
A família é um valor que se verga ao espírito das Escrituras: "Cuidais vós que vim trazer paz à terra? Não, eu vos digo, mas antes dissensão: pois daqui em diante estarão cinco pessoas numa casa divididas, três contra duas, e duas contra três" (Lucas 12:51,52).
Nota pós-litúrgica
Os cristãos herdaram dos judeus o "Alegrei-me quando me disseram: Vamos à casa do Senhor" (Salmos 122:1). Ideia oposta à de penitência.
Sentença
Nuno Markl é um arauto do humor moralista instituído.
Quem fala torpemente
Tendo a não ter grande respeito por pessoas que utilizam o estrangeirismo target na fluência do discurso.
Quem cala consente
Unas é bom nos balneários. Brinca às entrevistas. Sai-lhe uma frase do tipo "sabemos que os Estados Unidos são um país hipócrita". Podia ser uma piada mas ninguém se ri.

quinta-feira, julho 10, 2003

Aproximações II
Diz-se que a razão que levou Johnny Cash a trocar a Sun Records pela Columbia foi a relutância da primeira a deixá-lo gravar um disco de hinos religiosos. O mais semelhante que por cá temos é a cantora Nucha, recém-convertida à fé evangélica, que se queixa da falta de espectáculos e insuficiente distribuição dos seus discos desde que canta temas espirituais. Mas, meus caros leitores, continua a faltar-nos a tal profundidade metafísica dos americanos...
Preces
Por que razão são os judeus o povo escolhido? Porque são os únicos que conseguem orar desta maneira: "Afasta-me dos quartos de mulheres dissolutas" (Leonard Cohen em "O jogo preferido").

quarta-feira, julho 09, 2003

Confissão
Uma vez disse que o que distinguia um blogue de um calvinista de todos os outros era a ausência de contador de visitas. Menti. Foi uma desculpa esfarrapada pela minha inépcia informática. Agora que chafurdo na ausência de coragem para me expor às agruras da soberania divina sinto-me um pouco como Jonas. Pregando o arrependimento sem ter vontade que os pecadores se convertam.
Aproximações
Dou uma vista de olhos por um especial no VH1 sobre a Cher. Tecnicamente, o mais semelhante que por cá temos será a Adelaide Ferreira. Mas sempre sem a profundidade metafísica. A fatal profundidade metafísica americana...
Paz à alma da Dama de Ferro
Ouço o "Killers" na noite em que um cadáver esquisito tenta consolar as saudades do defunto no Pavilhão Atlântico. A morte é uma coisa séria. Dizem-nos as Escrituras que a seguir vem o julgamento (Hebreus 9:27). Sou impaciente com pessoas que julgam que estão acima da lei.
Inspirações
Uma nota sobre o artigo de hoje do meu estimado antigo professor Eduardo Prado Coelho. Para quem diz que jamais lhe passaria pela cabeça ter um blogue não está nada mal a semelhança entre a sua crónica e o "Momento Fantástico" que o extinto Escala-Estantes escreveu a 1 de Junho.

terça-feira, julho 08, 2003

Slogans II
Mais dois contributos para os gritos anti-abortistas. Chegam do amigo Samuel Úria: "Ninguém detenha a mulher prenha" e "Em caso de gravidez, pare! (do verbo parir)". Anti-abortistas: 4, Miguel Vale de Almeida:1.
A Sofia dele
Se alguma densidade filosófica existe em Manuel Maria Carrilho reside precisamente no facto de ele ter como mulher Bárbara Guimarães.
Lições da vida quotidiana II
Uma mulher com cerca de vinte e poucos anos conta-me uma anedota à volta do conceito de orgasmo. "A mulher tola é alvoroçadora; é insensata, e não conhece o pudor" (Provérbios 9:13).
Lições da vida quotidiana
Na mesma carruagem que eu viaja o pastor Dimas de Almeida. Ao chegar o revisor apercebe-se que o título de transporte que possuia era insuficiente para a viagem que fazia. Para um homem que se diz cristão mas não acredita no nascimento virginal de Jesus, na ressurreição e nos milagres a metáfora não podia ser mais clara. O Reverendo ficou retido na estação do século XIX.
Slogans
Chega o primeiro contributo para a colecção de gritos anti-abortistas, pelas mãos do meu amigo Miguel Sousa. Tão simples e oportuno que é um clássico imediato: "Deixem as trompas soar!".

segunda-feira, julho 07, 2003

Judiaria
"At bottom, anti-Semitism is not about hatred of Jews, as such, at all. It is about the obsessive location of evil in a blameworthy Other, an alien devil who conspires to destroy the state and corrupt virtue". O artigo completo aqui.
E a humanidade ganha sempre!
Não há grande diferença entre o conteúdo lírico dos Dead Kennedys e as elocuções do Bispo de Setúbal.
Gargantas em esforço sobre torsos desnudados
Vale de Almeida regressa de uma reunião sobre o aborto com um slogan pitoresco. Reza: "Tirem os rosários dos meus ovários". Proponho aqui uma colecção de alguns gritos de ordem anti-abortistas. Uma espécie de concurso adolescente rico em hormonas mas inconsequente. Entreguemo-nos à verborreia de ginásio. O meu primeiro é fraco, segue a estrutura do primeiro mas sugere o seguinte: "Tirem a revolução/ da minha ovulação".
Objecção
Por que será que a Igreja Católica quando fala de pecado só o associa à incúria com os pobres? Quando Frei Bento classifica esta enquanto uma espiritualidade muito fora de moda engana-se: desde o triunfo da Modernidade que Roma tem sido seduzida a restringir a fé aos aspectos que o humanismo vigente aceita. Daí não existir grande diferença entre a intervenção cultural do clero e a do comité central.

domingo, julho 06, 2003

A nova oitava da blogosfera
O meu Keith Richards pessoal, o meu suporte das noites de semi-boémia, o meu anjo sensual está aqui (o da capa do disco dos Van Halen).
Poste não recomendado a quem defende o princípio da Igualdade
No encontro entre o Etíope e Filipe (Actos 8.27-39) há duas coisas a salientar: o estrangeiro castrado não só convivia pacificamente com a ideia de que Deus se revelava especialmente a um povo determinado (do qual ele não fazia parte) como, ao lhe ser esclarecida a dúvida que encontrava no livro de Isaías, se apercebe que já não existe judeu ou gentio para a salvação. Conclusão possível: hoje somos uns invejosos cobardes mas acabamos por receber sempre mais do que merecemos.
Intersecções
Ao meu lado no culto e enquanto o pastor prega, um adolescente desenha o seu nome em letras estilizadas de grafitti. A igreja está no mundo e o mundo está na igreja.
Desconfortos
No poste sobre as entrevistas imaginárias o Socioblogue fala com um sentido de pertinência assinalável. Mas incómodo. Desconfio sempre de sociólogos.

sábado, julho 05, 2003

Navegar é preciso
Há um novo oceano a descobrir.
Conselho
Dois gigantes da música popular, que partilham de um certo pendor escatológico, a ouvir com frequência: Meat Loaf e Marco Paulo.
Nota
Apenas um último esclarecimento ao Bruno: quando menciono o Martin Luther King não o faço enquanto referência maior. Antes com a ironia de quem o considera um ícone do agrado de qualquer apreciação amaciada de cultura geral.

sexta-feira, julho 04, 2003

Do desejo III
Por último: "porque determinados projectos de transformação social souberam reconhecer na ideologia religiosa os perigos do adiamento da busca dos novos lugares da vivência humana, no fundo, o perigo de se perpetuarem as relações de desigualdade por alusão às promessas de outros mundos (esquecendo, talvez, coisas como a "teologia da libertação")". A transformação social como boa abstracção que é, torna-se fácil de reinvindicar para quem lhe quer pegar. A Teologia da Libertação é como a estátua do Cristo-Rei. Uma fotocópia de má qualidade que só interessa aos turistas, uma pulsão sexual de padres inconfessada e que se transforma num delírio de linguagem.
Do desejo II
Umas breves notas: quando o Bruno escreve: "A nossa geração está claramente marcada por um distanciamento/recusa em relação ao impacto dos valores religiosos. Primeiro porque esta recusa é uma denúncia afirmativa ou calada do peso de ideais conservadores, opressores das liberdades e fomentadores de formas de discriminação em relação às minorias" até que ponto quer estender o alcance da ideia para fora da experiência portuguesa? Não vou querer insistir muito nisto (o que tenho feito com alguma frequência) mas é suficiente observar o que aconteceu nos países com Reforma Protestante. Os valores religiosos dificilmente foram vistos enquanto elementos de opressão e discriminação. E nem preciso de dar o exemplo de postal ilustrado de Martins Luther Kings. Estes só satisfazem leitores da Visão. Urge radiografar a cultura deste país quando o nome de Calvino suscita achaques na esquerda. Historicamente Portugal parou no Século XVI.
Do desejo
Os Avatares escrevem com a prudência que se deseja acerca dos valores religiosos. O caro Bruno Sena Martins aproxima-se poeticamente do Apóstolo Paulo ao exortar à fé mas sentindo na carne o espinho. Deus ainda o libertará da sua paixão terrena pelo Fórum Social Português.
Dia de Acção de Graças II
No Independente, Leonardo Ralha fala da Cyndi Lauper.
Dia de Acção de Graças
Nos anos 80 o Senhor concedeu-nos a bênção dos Eurythmics.
Obrigados e concubinas
Agradeço a referência à Voz que o Pipi oferece nesta entrevista. Sempre suspeitei que o padrão de patriarca bíblico orgulhosamente polígamo era um tipo de comunhão solene entre nós.
Actualização
Novos convertidos: o filho pródigo e o pagão.
Corrida
Já há algum tempo que é assim. De cada vez que sou pressionado por gente esclarecida e sorridente corro para os claustros em busca de refúgio. O pior é que, como bom iconoclasta que sou, não há pedaço de madeira que me sirva uma imagem consoladora do Bom Soren.
Varas e varinhas
Alguns cristãos andam a proibir livros do Harry Potter nas bibliotecas das suas escolas. Nas mãos da Opus Gay o João César das Neves também já se deve sentir feiticeiro-aprendiz.
Ainda sobre a igreja
O meu tio Joel menciona sempre as instalações físicas de casa de oração. Nunca de igreja. Já são poucos os protestantes que se lembram de notar verbalmente esta diferença. Dizer "vou à igreja" será, em termos teológicos mais exigentes, incorrecto. A igreja (sem "i" maiúsculo) é o corpo de Cristo, escandalosamente presente naqueles que testemunham a sua ressurreição. O resto são locais. A palavra Templo seria ainda mais desajustada. O seu sentido velho-testamentário não tem nada com a eklesia.
Dia de S. Valentim
Comprados por menos de 4 euros: "Chore Of Enchantment" dos Giant Sand (deve ser engano de etiquetação dos empregados...) e o Quarteto 1111 (num registo gravado em duas pistas).
Exércitos
Há uma nova edição do Cantor Cristão à venda na Livraria Baptista (no Conde Redondo). Contra a colonização semi-litúrgica das hostes latino-americanas marchar, marchar!
Na reunião de oração da Igreja Baptista de Moscavide
A irmã G. ora: "Oh Senhor, protege todos os jovens à face da Terra!". "Não faz por menos...!", penso eu.

quinta-feira, julho 03, 2003

Cruzes e foices II
Só mais uma nota aos amigos canhotos. Acerca de exibições públicas de moralidade, comprometimentos com edificações e habituais prédicas do clero vermelho, o que posso dizer é que por aqui o Evangelho lê-se na língua de cada fiel. Assim sendo, nisto da construção civil, são mais as Torres de Babel do que as tendas de confraternização.
Cruzes e foices
Dizem os canhotos: "Kierkegaard encontrava-se no meio da revolução hegeliana do pensamento e por isso a sua importância parece-me menor ou mesmo muito menor em relação à do pensamento marxista para a época contemporânea". Já se esperava tal profissão de fé. Aqui o reverendo prefere responder mesmo com as palavras do neurótico maníaco-depressivo com uma séria disfunção sexual. "Pela minha parte já despendi bastante tempo para aprofundar o sistema hegeliano e de nenhum modo julgo tê-lo compreendido; tenho mesmo a ingenuidade de supor que apesar de todos os meus esforços, se não chego a dominar o seu pensamento é porque ele mesmo não chega, por inteiro, a ser claro" (in Temor e Tremor).
Acerca do casamento com a liberdade III
Prometo que é a última.

Há um pesar que me angustia
uma dor que não chega tarde
Falam do conceito de ironia
sem citar o Kierkegaard!
Acerca do casamento com a liberdade II
E já que andamos pela concepção simbólica da realidade, uma quadrinha...

Dizem que sou frio e calculista
mas não julguem que é dureza
Ter riscado da lista
a lua-de-mel em Fortaleza


Queiram desculpar-me. Volto à apologética não tarda.
Acerca do casamento com a liberdade
O meu caro amigo Bruno e os Canhotos preocupam-se com a falta de compromisso dos blogues da direita. Colocaria as coisas nestes termos: quem será o mais casado? Aquele que enverga o anel de matrimónio ou o que resiste às erecções extra-conjugais que a vida nos vai espalhando pelo caminho?

terça-feira, julho 01, 2003

No comboio, ao lado com o pedagogo Rousseau
Aproveitando a boleia: fique sabendo que se educar o seu filho a ouvir diariamente um poema do Livro do Desassossego ao deitar ele nunca vai querer brincar com um G.I. Joe.
E as crianças, Senhor?
A Sic apresenta uma peça sobre os luso-americanos que combateram nas duas Guerras do Golfo. Termina com um diálogo entre dois filhos de um destes soldados. Os pequenos pedem ao pai que os ensine no manuseamento eficaz das armas que vêem, deslumbrados, nas fotografias da campanha. Mas já agora e pegando no cardápio da corporação, não será isto abuso de menores? Propaganda? Não. Uma espécie de make love not war com câmara mas sem cama. A jornalista deve ter-se sentido a Mohandas Mahatma da estação. Paz à sua alma inepta, símbolo luminoso do que é o jornalismo por estas vizinhanças.
Nota quotidiana
Conduzo um carro com quase vinte anos. Tenho a rádio sintonizada na Comercial. A estação é o símbolo do granda som. O meio audiovisual português afina por este diapasão. Um misto de sofisticação e costela saloia. Faz lembrar as constantes revoluções gráficas do Diário de Notícias.
Pensamento do dia
Um mau poeta não é necessariamente um bom homossexual.
Conversões
O Escala Estantes não ressurgiu dos mortos, proeza conseguida apenas pelo único Lázaro da blogosfera - o Mukankala. Mas os seus autores regressam, qual Apóstolo Paulo pós-estrada de Damasco. A sua missão é maior. O Caminho passa agora pelo Meridiano.
Refeições
Quando Jesus passou por Zaqueu disse-lhe: "importa que eu fique hoje em tua casa" (Lucas 19:5). Mais do que fazer-se a comida e cama à borla, o Mestre tinha uma agenda que não se limitava ao material. Ontem fui almoçar com os amigos do DeDireita. Faltava apenas o Pedro. Embora me tenham assegurado que apenas o ausente era crente, certo é que, exceptuando o Manuel, todos eles têm nomes de discípulos.