segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Chamar
Ao ouvir o meu pastor dizer que "açucaramos o Evangelho" lembrei-me das palavras de um bom leitor acusando-me de passar a vida a julgar. Embora pense que existe aqui alguma candura intelectual (não confundir com candidíase, problema ginecológico) este é um facto incontornável: em cada cinco linhas minhas, quatro chamam alguém de "filho de Belial" (que é como quem diz "bastardo do Demo"). Estilo? Apologia? Embuste literário? Disfunção eréctil?
Reconheço que prefiro dispensar o Júlio Machado Vaz e explicar a coisa com o Espírito Santo. Chamem-me tonto. Eu chamo-vos pagãos.

sexta-feira, fevereiro 25, 2005

Good guys go to heaven
Os soberbos não vão a lado nenhum.
De Stijl
White? Stripes! White? Stripes! White? Stripes! (Ir prolongando como se num culto pentecostal estivéssemos.)

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

Castigos do Éden
Às mulheres as dores do parto. Aos homens a ausência delas.
Na minha prateleira de discos II
A seguir ao Neil Diamond vem o Neil Young.

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

Saio do Media Markt assim
O mundo é uma gigante árvore de sacos de plástico em que uns sabem apanhar a fruta melhor do que os outros.
Carne e espírito
O catolicismo das portuguesas leva-as a recusar a hipótese de se despirem para uma revista. O catolicismo das brasileiras leva-as a pousar nuas para a Playboy com um crucifixo ao peito.

terça-feira, fevereiro 22, 2005

Testes apocalípticos
Alguém anda a simular o Armagedão com o som da Sala 1 do Monumental.
O Pedro Lomba
Voltou a escrever no Fora do Mundo. Esta é uma Boa Nova que precisa de evangelistas.

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

Sábado à noite
Dou os últimos retoques no sermão ao som dos Tindersticks. A coisa no púlpito sai mais próxima de João Baptista do que do Padre António Vieira. Nem só de relações de causalidade vive o homem.
Meninas
O namoro é um estágio da vida (expressão demasiado kierkegaardiana para uma manhã de segunda-feira) constrangedor. O casamento permite repor os valores em alguma decência social. Mas meninas que ainda não sendo casadas já usam o apelido dos namorados são um desafio à virtude cristã da benevolência.
Há blogues novos
Que vale a pena visitar:
- A Mão Invisível
- Silsmaria
- Eu Padre.
É um um trio bem ecuménico, I must say.

sexta-feira, fevereiro 18, 2005

É difícil ouvir os N.E.R.D.
Sem nos recordarmos dos Beastie Boys. Eu, que tenho uma redentora parcela de saloio, desconfio de quem consegue ser sempre cool. Os N.E.R.D. conseguem-no sem me perturbar nada.

quinta-feira, fevereiro 17, 2005

Para um país que aprecia aparições

Canonizemo-los, irmãos!
A maior parte dos meus leitores não são crentes
Ebenézer (palavra hebraica que significa "até aqui nos ajudou o Senhor"). Esta é uma vaidade que me esforço por não esbanjar na face dos meus amigos mais pios. É que os fiéis são na maior parte das vezes uns chatos. Vêm a este blogue e não o entendem. Perguntam-me "qual é o objectivo?" confirmando o pecado supremo dos bem-aventurados: há sempre uma meta, uma agenda, uma borbulha para espremer.
Talvez por tanto falar no Céu alguns cristãos estão a perder a hipótese de se divertirem um bocadinho nesta vida. Dietas de hóstias não dão cus que enchem as calças, perdoem-me a ousadia. Nós sabemos que o Deus judeu é o verdadeiro por causa do seu humor. Toda a tralha pagã é inútil porque não tem gracinha alguma. Os meus amigos evangélicos que se cuidem: com tão soturnos modos ainda acabam a adorar os ídolos. Buda, Maomé, Marx e Foucault agradecem.

quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Este homem chama-se Rick Rubin
O branco que mais percebe de hip-hop. Fez dos Slayer uns senhores, ofereceu aos Red Hot Chili Peppers o melhor disco da carreira deles e tornou Johnny Cash um cantor da moda. Aparece ao lado do Vincent Gallo no videoclip do melhor rap dos últimos 10 anos: "99 Problems" de Jay-Z. Ele é muito bom e isso deve ser conhecido tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra.

Parole
Há um velho cântico que os evangélicos entoam que diz "há momentos que as palavras não resolvem". É tímida a canção. E intimamente os cristãos sabem-no. São escassos os momentos que as palavras resolvem. As próprias Escrituras oferecem vários exemplos. Uma das pessoas mais certeiras com as palavras foi um romano chamado Pôncio Pilatos. De pouco lhe servia. Basta ver que Jesus, segundo três dos quatro evangelistas, em tanta conversa possível apenas lhe respondeu: "tu o dizes". O resultado final foi aquele que todos conhecemos.
Robin dos Bosques era um idiota com remorsos
Infringir por infringir, mais vale roubar aos pobres para dar aos ricos.

terça-feira, fevereiro 15, 2005

O luto nacional
Depois de enumerar algumas das situações possíveis de cópula com a apresentadora do programa matinal da RTP a rapaziada salientou o facto da Irmã Lúcia ter falecido num dia 13.
O mal-encarado
Numa congregação de cerca de 50 pessoas há sempre, pelo menos, um rosto mal-encarado. Esta é a minha experiência na Igreja Baptista de Moscavide. Mesmo que a prédica seja macia, o profeta açucarado e a música arrebatadora nada demoverá o fiel zangado.
O macambúzio resiste. A alegria alheia enche-lhe o depósito da amargura. O melhor que o pregador tem a fazer é evitar fitá-lo. Embora o cristianismo despreze os rebuçados orientais há que ser muito zen nesta matéria. E no fim aplicar uma disciplina Paulina: encomendar o carrancudo a Satanás.
Aqui a atitude mais santa resume-se em quatro palavrinhas: "o diabo o carregue". De preferência para fora da minha igreja.

segunda-feira, fevereiro 14, 2005

Joana Amaral Dias
Uma mulher que se sabe bonita e assim se mantém não pode ser de esquerda. Ou se assoa o nariz do mendigo ou se pinta os lábios. Nestes casos de equívoco ideológico aprender a lição pode depender de um decrescimento estético. Não se lhe arranja um desviozinho do septo nasal?
Uma breve lição acerca de Golias
Não se diz "desafio as fileiras de Israel!" impunemente.
Télévisão
Vejo no GNT Regina Duarte falar nas "possibilidades filosóficas da poesia". A viúva Porcina morreu.

sexta-feira, fevereiro 11, 2005

O que é uma parede?
É onde se colam cartazes com a cara da Margarida Marinho.
Os pagãos precisam das coisas explicadinhas
Da ilusão que uma lógica superior sustenta os acontecimentos. Por isso rasgam as vestes quando essa fina película de pretexto se rompe. Blasfemam após a catástrofe natural (haverá alguma que não o seja?), encharcam de gasolina a igreja da freguesia.
Deus não precisa de ser louvado pelo rumo dos eventos mundiais. Nessa perspectiva até já teria sido despedido por justa causa. O Senhor não é nenhum funcionário. Não é avaliado por coisas. Não há formulários onde pôr o xis no quadradinho. Não é escrutinado por cumprimento de obrigações. Deus deve ser louvado tão somente porque Ele é Deus. Demitam os seus advogados de defesa.

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

Uma nota sobre a campanha eleitoral II
A cena em que Jesus expulsa os demónios do homem possesso de espírito imundo* é evocada sem névoas no último cartaz do PP. Portas parece o capataz do temível e endiabrado exército de Legião.

* Marcos 5
Uma nota sobre a campanha eleitoral
Não é raro vestir-me como se um eleitor do Bloco fosse. Ontem saí para a rua com uma daquelas coisas de fecho até à gola celebrizada por Louçã nos debates televisivos.

quarta-feira, fevereiro 09, 2005

Não se lembrarão eles
Que pouco lhes adianta falar a língua dos anjos?
Tempos houve que tinha vergonha de ser evangélico
Disfarçava a coisa preferindo o termo "protestante". Depois as coisas mudaram. A vergonha em relação a algo é das poucas coisas que confirmam que esse algo nos pertence. Sem embaraço não há amor.
Quando eu tinha vergonha de ser evangélico julgava que era importante a troça que os meus colegas da Faculdade poderiam suscitar em relação à minha qualidade religiosa. Hoje e apesar de achar que o escárnio pode ser um modus divino, entendo que a fé é sempre mais importante que uma t-shirt dos Blur.
O evangélico é uma criatura que suscita pena (como qualquer coisa criada por Deus, sobretudo depois do Éden). Tem complexos simultâneos de inferioridade e superioridade, lê maus livros, ouve má música, encena humildade patêga e não tem sentimentos muito cristãos pelo Papa. Dilacerado por constrangimentos ocasionais, eu tenho muito orgulho em ser evangélico.

segunda-feira, fevereiro 07, 2005

Nota exterior
Quando vou na rua e três pessoas de seguida olham para mim fico com receio de, não reparando, estar a sangrar do nariz.

sexta-feira, fevereiro 04, 2005

Aquele que não lambe botas presta-se a justas beatificações
Mas o seu desempenho em sociedade também pode ser motivo de desassossego. Prevenir a ruína da nossa civilização passa pelo suave adular que prestamos a indivíduos específicos. Pessoas inteligentes não devem ser pedra de tropeço pelo facto de terem as suas botas lambidas. O mesmo se aplica a gente com negócios bem sucedidos e personalidades com talento artístico.
O Senhor há-de gostar destes amigos também. Contudo, sem deslumbramentos. Devemos recordar a passagem bíblica que diz que "todo o joelho se dobrará"*. Até aquele que tem o calçado luzidio da saliva fresca.

* Romanos 14:11
Prémio de consolação
Há sempre alguém que se precipita para dentro de um poço mais profundo que o nosso.

quinta-feira, fevereiro 03, 2005

Outro breve manifesto literário
O acto de escrever é, em si, já um exagero assinalável.
Segundo ouvi dizer
Desde que um anúncio comparou o andar das crianças em cueiros ao dos cowboys toda a indústria das fraldas tem vindo a alterar o design dos seus produtos. Até o impiedoso universo mercantilista cede ante uma metáfora eficaz.

quarta-feira, fevereiro 02, 2005

Sermão de Quarta-Feira
Os cidadãos têm vidas miseráveis cheias de brinquedos. Parece um desígnio disciplinar de Deus para com o Ocidente: ser miserável cheio de brinquedos. E estes quase nada são. Já dizia Tiago na sua epístola: "Nada tendes porque não pedis. Pedis e não recebeis porque pedis mal, para o gastardes em vossos prazeres"*.

* Tiago 4:2-3
A vantagem do Trash Metal
Sobre os outros géneros musicais é que na maioria das vezes a cantiga começa com uma malha de guitarra solitária. Depois é que se juntam os outros instrumentos. A coisa funciona como uma ameaça. Só se trama quem quiser.

terça-feira, fevereiro 01, 2005

Atravesso a estrada
Vergado pelo peso da cadeira do bebé. Equilibra-me uma daquelas pastas que os professores do Secundário (essas criaturas que também podem ser salvas) recebem como brinde das editoras de manuais escolares. Uma sexagenária (seria septuagenária?) oferece-me ajuda para segurar o tal volume. Por mais débil que seja a minha virilidade sou obrigado a recusar o tão prestimoso auxílio. Ela ainda acrescenta que teve seis da espécie que agora seguro a custo. Eu, fisicamente impotente mas resoluto na minha paternidade esforçada, confesso que este é o primeiro.
Danos colaterais
Pelos vistos, quando os missionários cristãos pregaram em África contra a poligamia provocaram o desenvolvimento da prostituição, até à altura inexistente.