quarta-feira, setembro 30, 2015

A ganhar embalo para o Fim-de-Semana Cheio na Lapa deste ano (9-11 Outubro)

O Nuno Markl já é um amigo da nossa igreja desde 2011. Esteve connosco no tempo da cave, e está connosco agora no tempo do salão.  Se a sua voz funciona como gatilho de muitas gargalhadas, é preciso ouvir o que de sério está a ser dito nas entrelinhas. Esta é a conversa que tivemos com ele no ano passado.


terça-feira, setembro 29, 2015

Ouvir

Para trabalharmos a favor daqueles que aparentemente não querem saber de nós, precisamos mais do que nunca de saber quem somos. Foi isso que os judeus demonstraram, quando de Deus receberam na Babilónia o estranho pedido de fazerem bem a um povo que lhes fazia mal. Esta é uma mensagem difícil mas necessária.

O sermão de Domingo passado, chamado "O Momento Jerusalém e o Momento Babilónia", pode ser ouvido aqui.


sexta-feira, setembro 25, 2015

Agenda

O programa ainda é provisório mas deve ser final nas vossas agendas. Ainda por cima a entrada é gratuita. Espalhem!

quarta-feira, setembro 23, 2015

A ganhar embalo para o Fim-de-Semana Cheio na Lapa deste ano (9-11 Outubro)

Acho que a amizade que a Igreja da Lapa ganhou com a Anabela Mota Ribeiro tem a ver com o facto de ela ter uma voz que procura outras. Mostra atenção e cuidado para ouvir e mostra atenção e cuidado para escrever acerca do que ouviu. A conversa que tivemos com ela no ano passado pode ser vista e ouvida aqui.


terça-feira, setembro 22, 2015

Ouvir

Na Bíblia as cidades não começam por ser grande coisa: aparecem como espaço para que os maus possam continuar a ser maus.

O sermão de Domingo passado, chamado "Caim, o primeiro urbanista", pode ser ouvido aqui.


sexta-feira, setembro 18, 2015

Não usar o nome do rock em vão

Estou numa relação com a música cristã e ela é complicada. Aliás, talvez valha a pena explicar o que é que entendo por música cristã. Na maior parte das vezes chamo música cristã a uma coisa que não tenho como música cristã. Como assim? Na rotina evangélica, música cristã é tudo aquilo que se convencionou chamar música feita com objectivos mais ou menos religiosos. Logo, não é música cristã apenas a música que se canta no culto, mas é música cristã aquela que se espera que um cristão ouça fora dele.

Ora, uma das minhas dificuldades é que raramente tenho vontade de ouvir a chamada música cristã fora do culto. Porquê? Porque a música cristã, sendo feita por artistas cristãos com objectivos ditos cristãos, é geralmente uma versão sem grande categoria da música não-cristã. No fundo, a dita música cristã é uma música à semelhança da música popular (que encaixa genericamente no pop e no rock) que é feita para ser consumida como a música popular é. Imaginem, um evangélico tem um carro que usa para ir para o trabalho e o que é que ele põe no leitor de CDs? Essa tal música dita cristã.

Se repararem, disse no primeiro parágrafo que chamo música cristã a uma coisa que não tenho como música cristã. Explicaria assim: para mim, e em termos muitos essenciais, não há música cristã ou música não-cristã. Apenas há música. Que pode ser boa ou má. Dentro do protestantismo, a tradição mais reformada enfatiza a arte como uma expressão natural e não como uma área de diferenciação do contexto que não é cristão. Simplificando muito e pegando no exemplo dado por Lutero: se és um sapateiro cristão, não fazes sapatos cristãos - fazes bons sapatos. Se és cristão, não fazes boa música cristã - fazes boa música.

Na prática do dia-a-dia, concedo chamar música cristã à música feita por cristãos porque não me apetece estar sempre a dar estas explicações. Como sei que a maioria dos evangélicos opera com estas categorias, aplico-as sem me sentir muito culpado. Por isso uso um nome para uma coisa mesmo quando acho que essa coisa não é propriamente o nome que lhe chamo. Que fique claro: uso a expressão "música cristã" mas para mim ela não existe. Obrigado pela vossa paciência.

Houve uma época em que o mundo europeu era mais religioso e por isso o melhor da religião confundia-se com o melhor da cultura europeia. Essa é a razão porque alguns dos hinos religiosos facilmente se tornavam hinos nacionais e vice-versa. O melhor do culto confundia-se com o melhor da nação. Para quem visita uma igreja protestante mais tradicional, ainda consegue sentir isso: muitos dos hinos têm um sabor solene ao ponto de quem canta se sentir a edificar um país. São hinos a sério!

Com a perda da religião na Europa, é como se os cristãos ficassem tão alienados da cultura abrangente que já não conseguem influenciá-la mas, tragicamente, só ser influenciados por ela. Reparem na ironia: o facto de haver uma música dita cristã que faz uma versão religiosamente segura da música não-cristã só prova que os cristãos pedem uma esmola à cultura que os despreza. Os evangélicos que se sentem mais santos por só ouvirem música dita cristã, são aqueles que mais estão pela trela em relação aos ditames da música não-cristã. É só prestarem atenção ao modo atrasado e requentado como a música dita cristã imita a música não-cristã.

Passei uma adolescência muito cioso desta tese e fazendo pouco de todos os evangélicos que ouviam música dita cristã. Apesar de ter crescido a ouvir muitas cassetes que o meu pai comprava no Núcleo (a primeira loja que vendia música cristã em Portugal, ali no Pendão em Queluz), que iam da Amy Grant ao Michael W. Smith, eu tinha a mania que era um adolescente mais esclarecido que os outros adolescentes evangélicos. Em boa verdade, essa mania pelo menos fez-me ouvir música decente e não ter paciência para imitações. No meio do processo, essa mania também se converteu em muito pecado de arrogância e vaidade. Mas, lá está, sempre me livrou dos Hillsongs da vida.

Uns anos mais tarde, e com o Espírito Santo a acusar a minha arrogância, pude ir ouvir as bandas evangélicas que amava odiar. Pegando num exemplo que já mencionei: os Hillsongs. Quando digo Hillsongs faço de propósito porque a música da igreja Hillsong não se chama assim. Escolho dizer Hillsongs como quem mostra superioridade e indiferença ao fenómeno de massas do meio evangélico. Mas quando assisti na primeira fila aos Hillsongs no Tivoli (graças à generosidade do meu amigo Mário Rui), não me armei em esperto. Percebi a intensidade que eles colocavam no que faziam e deixei-me ir atrás das forças deles. Foi uma boa experiência. No fim, a minha conclusão é: não sou de Hillsongs porque para mim rock é rock, e música de igreja é música de igreja. Quando a música de igreja se torna rock, é uma blasfémia contra o rock. E temos de levar a sério aquilo que no rock é sagrado. Rock na igreja é usar o nome do rock em vão.

Um à parte para dizer que, ao contrário do que alguma imprensa diz, eu nunca fiz rock cristão. Eu não faço rock cristão por causa do que Lutero explicou. Eu faço rock. O facto de haver fé no meu rock é apenas sinal que há Tiago no rock que o Tiago faz. Perdoarão a comparação, mas o mesmo se aplica a todos os rockers fundamentais: Elvis, Jerry Lee Lewis, Johnny Cash, Bob Dylan, Bruce Springsteen. É natural que Portugal não perceba a fé no rock porque Portugal não percebe o rock.

Grande caminhada para aqui chegar: vem amanhã o Eduardo Mano. O Eduardo Mano é um músico cristão. Mau! Significa isto uma inversão de tudo o que acabei de escrever? Não. O Eduardo Mano é um músico cristão que faz música que, sem pedir desculpas a ninguém, quer contribuir para que as pessoas tenham mais fé. A música do Eduardo Mano não é boa porque ele quer contribuir para que as pessoas tenham mais fé. A música do Eduardo Mano poderia ter esta nobre intenção e ser uma valente pessegada. Mas, de facto, a música do Eduardo Mano é boa e contribui para que as pessoas tenham mais fé. Milagre!

Descobri o Eduardo Mano há uns anos e ele agitou seriamente o preconceito que tinha com a música feita por evangélicos brasileiros. Eu passei a adolescência a especializar-me em fazer pouco da música evangélica brasileira. O Eduardo Mano faz parte de uma nova geração de músicos evangélicos brasileiros que não faz boa música evangélica - faz boa música. Há outros nomes que interessa descobrir (conheci também o Marcos Almeida dos Palavrantiga que é um moço cheio de talento). O Eduardo Mano é o Ketih Green brasileiro (vocês têm de conhecer o Keith Green que é dos músicos mais talentosos de sempre a fazerem música que serve para contribuir para que as pessoas tenham mais fé).

Ora, o Eduardo Mano chega amanhã a Portugal e adivinhem quem, se Deus quiser, o vai buscar ao Aeroporto? Ah pois. Com este vosso querido, é assim. Se eu fosse a vocês, desligava um bocado a música que estão a ouvir e ia espreitar a música "Mais chegado que um irmão", apenas para começar. Vejam bem que o Eduardo Mano vem para Portugal com o desejo de tocar para os portugueses. Estes brasileiros metem cada ideia na cabeça! No Domingo vamos ouvi-lo um bocadinho na Lapa. Mas a Lapa não é Portugal inteiro. Wise up, kids!


quinta-feira, setembro 17, 2015

Do ano passado
Estamos a caminho do Fim-de-Semana Cheio na Lapa (9 a 11 de Outubro)! No ano passado ouvimos o testemunho de uma família da nossa igreja - a família Richardson (já devem ter ouvido falar dela), acerca de como a fé faz a diferença no meio de uma adversidade como o cancro da mama (e no meio da adversidade que é escrever um livro sobre o cancro da mama). Essa palestra pode ser ouvida aqui.


quarta-feira, setembro 16, 2015

Ouvir
O sermão de Domingo passado, chamado "Emparaísar o mundo à força", pode ser ouvido aqui. Fala de Dante, da Princesa Elsa do Frozen, e de outras coisas que nos ajudam a entender que somos chamados a servir os lugares que habitamos, e não apenas esperar que esses lugares nos sirvam.




terça-feira, setembro 15, 2015

Quando Setembro está sereno, um tipo arranja uma maneira de falar sobre calvinismo

Esta categorização é meio ridícula mas vou fazê-la. Com ela, quero estabelecer a defesa de uma coisa que acho importante. O meu país preferido é os Estados Unidos da América. Portugal não é o meu país preferido. Portugal é o meu país. O facto de ter uma preferência pelos Estados Unidos da América não significa que não goste de outros países. Antes pelo contrário, sublinha a surpresa que é descobrir coisas fantásticas em países que não julgaria apreciar muito. Vejam bem: no ano passado descobri que Paris é uma cidade maravilhosa. Eu, que não tinha grande paciência para os franceses.

Onde quero chegar com isto é que reconheço que ter nos EUA uma preferência me desequilibra para colocar as coisas em perspectiva em muitas questões importantes. Por exemplo, ouvi o Pastor Luiz Sayão a dizer este ano que um dos problemas dos evangélicos de países como o Brasil ou Portugal é andarem demasiado a reboque da personalidade anglo-saxónica, mais influenciada pelo protestantismo que a personalidade latina. Por um lado, é da elementar justiça que os evangélicos latinos honrem os evangélicos anglo-saxónicos porque foram os últimos que deram as suas vidas para evangelizar os primeiros. Mas, por outro lado, também é verdade que não convém ser mais papista que o papa. O facto de nós, evangélicos latinos, termos sido evangelizados por evangélicos anglo-saxónicos, não deve fazer de nós imitações foleiras de anglo-saxónicos. Se Deus nos fez latinos, vivamos os valores da Reforma Protestante com a nossa latinidade (perdoem-me a expressão xaroposa, "latinidade"). Afinal, o evangelho é Cristo e não a cultura anglo-saxónica.

Tendo dito isto, reconheço que  o Pastor Luiz Sayão não deixa de ter alguma razão quando dá a possibilidade de debatermos demais a questão calvinismo-arminianismo, como exemplo de seguirmos obsessivamente os anglo-saxónicos. Com isto, ele não está a dizer que a questão não tem méritos (nos comentários que o Sayão faz à Bíblia de Estudo Esperança, as suas respostas parecem-me solidamente reformadas), mas está a desejar um cenário onde lidaremos com os debates clássicos da fé com respostas mais próprias do tempo e do lugar que habitamos. Daquilo que me apercebi das conversas com o Pastor Sayão, ele crê que a personalidade latina tem mais a ver com a personalidade hebraica do que, neste caso, a personalidade anglo-saxónica. Se os anglo-saxónicos tendem a ser analíticos, os hebraicos têm mais espaço para conciliarem aparentes contradições através de paradoxos - e os portugueses e os brasileiros também. É uma tese cativante e que talvez tenha pés para andar. Digo eu isto que, como afirmei logo ao início, sou fã da lógica simples e clara dos americanos.

É a partir destes cruzamentos que reconheço que, lá está!, quando a questão é calvinismo e arminianismo, o espaço português para o assunto é bem estreitinho. Como latinos que somos, não temos a tendência para pensar em categorias como Deus e tempo de uma maneira analítica. A nossa natureza é diferente: no mediterrâneo pensa-se em Deus e no tempo com mais coração. Logo, a coisa resvala facilmente para a nostalgia (quando corre bem!) e para o fatalismo (quando corre mal!). Reparem: logo, um calvinista português é sempre um monstro. Se duvidam, leiam o Padre António Vieira. O calvinista português é um monstro porque trai o seu país: acreditar em Deus à la Calvino é acreditar em Deus à Europa do Norte (mesmo tendo em conta que Calvino era francês). O calvinista português é um monstro porque parece que celebra a vida com um prato que nos sabe sempre amargo - que prazer é que podemos tirar do facto de Deus mandar no tempo se o tempo é aquilo que, enquanto portugueses, nos trama? Na Europa do Norte as pessoas dão-se ao luxo de serem mais pontuais porque lidam com Deus e com o tempo com uma frieza que nós não. O calvinista português é um monstro, um traidor da pátria e um sádico. Não é fácil.

Reparem. Eu, que sou um calvinista português, tenho a noção que isto torna o caminho dos calvinistas portugueses mais perigoso mas também mais divertido. Se somos bandidos aos olhos dos outros, mais vale que pratiquemos uns quantos crimes. As pessoas malham em nós porque elas não têm categorias para nos domesticar. Elas acham que fazemos por capricho coisas que elas não entendem por comodismo. As pessoas em Portugal não percebem de religião porque entender mais de religião de alguma maneira tira-as de Portugal. É mais fácil continuar neste cantinho sossegados do que pensar em assuntos do camandro como Deus e o tempo com categorias que nos parecem estrangeiras.

Having said all of this, quero terminar este texto a malhar nos calvinistas portugueses. Porque no apertadíssimo meio evangélico português, os calvinistas não estão a fazer bem o seu trabalho. "E porquê?", perguntam vocês. Os calvinistas em Portugal não estão a fazer bem o seu trabalho porque, de uma maneira geral, não estão a fazer trabalho. Dou um exemplo. Os calvinistas que por aí andam cheios de salamaleques reformados só se dão ao trabalho de ler o João Francês a partir dos Johns Americanos (mais um ponto para o Sayão). Ainda hoje, quando lia a minha dose das Institutas, quis fazer sapateado no primeiro andar deste apartamento da igreja onde me encontro. "E porquê?", perguntam vocês. Porque ler Calvino nos faz entender que todo o mundo faz sapateado, é só tirar os auscultadores dos ouvidos e escutar.

Há um mês perguntaram-me quais eram os dez livros que todo o cristão deve ler. E, claro!, eu disse na lista as Institutas. Boa parte das pessoas que me ouviam, conhece-me, e devem ter pensado: "lá está este chato a falar do Calvino." O que eu lhes quis dizer é que ler Calvino rebenta os nossos preconceitos com ele. Como? Vejam, lendo os últimos dois parágrafos que escrevi na ficha de leitura de hoje.

Quando Calvino une na mesma equação Deus e tempo ele está sempre a querer lembrar uma lição fundamental: Deus é livre. Deus é livre! O facto de ter criado o tempo não é algo que lhe sublinha o carácter negativo mas positivo.

Insisto nesta ideia porque creio que este é um dos grandes erros de cada vez que se aprecia a obra de Calvino. Pendurar o Reformador no cabide da predestinação é confundir as causas com as consequências. Calvino não viveu para pregar a predestinação. E por isso é ridículo que os ditos calvinistas se resumam à questão da predestinação. A predestinação é uma consequência de algo muito maior. A predestinação em Calvino não é o assunto mas apenas uma consequência dele. O assunto de Calvino é a liberdade de Deus. Calvino é um homem extraordinário porque celebra o Criador como a pessoa mais livre do universo.

Claro que a partir do momento em que Deus cria o tempo e criaturas que se inscrevem nesse tempo, isso significa que as criaturas vão ter limitações inerentes ao facto. Essas limitações passam pelo facto de os homens não serem pessoas além do tempo como Deus é. A predestinação é apenas uma consequência lógica de Deus estar além do tempo e nós não. Mas é preciso descobrir o paradoxo aqui: a mensagem que a predestinação nos quer dar não é que estamos presos porque vivemos dentro do tempo. A mensagem que a predestinação nos quer passar é que vivermos dentro do tempo, com as suas limitações óbvias, é em função da liberdade de Deus. A pessoa que quiser honrar a memória do Calvino não sai para a rua a gritar: “esqueçam porque isto já foi tudo tramado!” A pessoa que quiser honrar a memória de Calvino sai para a rua a gritar: “se Deus é livre e foi ele que nos criou, nós também podemos ser livres!” Foi para isso que o Filho veio e é para isso que o Espírito Santo age em nós.


quinta-feira, setembro 10, 2015

Estamos a um mês do Fim-de-Semana Cheio na Lapa

Para nos irmos entusiasmando, estamos a colocar online as conversas do ano passado. Esta primeira, foi a que deu o pontapé de saída e foi um encontro de amigos. Cinco pastores evangélicos de origens diferentes tiveram um diálogo animado que quer ser um encorajamento a um bom ambiente inter-denominacional no nosso país.

Marquem na vossa agenda a sexta-feira 9 de Outubro, o sábado 10 de Outubro e o Domingo 11 de Outubro!


quarta-feira, setembro 09, 2015

Laudato Si do Papa Francisco

Não há melhor mês que Agosto para ler uma encíclica papal acerca do ambiente. Estamos mais soltos para apreciar a natureza e, nesse embalo, provavelmente mais soltos para apreciar a própria encíclica. Acho que senti as duas dinâmicas durante o tempo que investi a ler "Louvado Sejas (Laudato Si)" do Papa Francisco. Mantenho as minhas palavras: acho disparatado um pastor protestante em Portugal que não liga ao que o Papa diz. Para todos os efeitos, antes de Portugal ser Portugal já cá estava Roma. Por isso, a melhor divergência que podemos ter com a Igreja Católica Romana passa pela atenção ao que ela diz. Também porque, como se tornará óbvio, há muita e boa convergência a assinalar. Como não é conveniente ir ponto por ponto, gostava de partilhar onde o Papa acerta e onde o Papa não acerta. Comecemos pelos primeiros. Para quem pense: "quem é este chavalo para achar que tem alguma coisa a dizer sobre o que o Papa diz?", respondo: "é um chavalo protestante. Os protestantes protestam." That's the way things are. Tive muito trabalhinho para agora vos dar isto.

1. O Papa acerta quando explica que o lixo na terra começa sempre por ser lixo dentro dos homens

A afirmação clara que a degradação física do planeta é necessariamente consequência de uma degradação moral (no ponto 4 e um pouco por toda a encíclica). A verdadeira ecologia não pode ser uma qualidade fora de uma convicção espiritual e religiosa. Os meus companheiros católicos romanos perdoarão a minha franqueza, mas o Papa Francisco ainda acerta mais na mouche quando cita o melhor Papa vivo, que é Bento XVI: "o desperdício da criação começa onde já não reconhecemos qualquer instância acima de nós, mas vemo-nos unicamente a nós mesmos." A verdadeira mudança na qualidade do ambiente externo tem de começar na qualidade do ambiente interno dos homens, "caso contrário estaremos apenas a tratar dos sintomas" (no ponto 9). E mais: "uma ecologia integral requer abertura para categorias que transcendem a linguagem das ciências exactas ou da biologia e nos põem em contacto com a essência do ser humano" (no ponto 11). E mais no ponto 111: "Buscar apenas um remédio técnico para cada problema ambiental que aparece é isolar coisas que, na realidade, estão interligadas e esconder os problemas verdadeiros e mais profundos do sistema mundial."

2. O Papa acerta quando fala do Céu para explicar o que corre mal na terra

Só a partir desta ecologia integral (expressão muito e felizmente repetida), provida de uma componente fundadora que é espiritual, é que uma postura de "dominador, consumidor ou mero explorador dos recursos naturais" (no ponto 11) pode ser, por si, errada. Ou seja, e aqui as palavras são minhas e não do Papa, se não existir um plano mais justo e superior àquele onde estamos, enquanto criaturas, por que razão é que as nossas acções sobre o ambiente podem ser tidas como certas ou erradas? Ou há um criador, moralmente superior às criaturas, ou a ecologia tem a espessura ética de um fio de cabelo. "Não se pode propor uma relação com o ambiente, prescindindo da relação com as outras pessoas e com Deus. Seria um individualismo romântico disfarçado de beleza ecológica e um confinamento asfixiante na imanência (no ponto 119)."

3. O Papa acerta quando esclarece que é o que é bom no Céu que torna melhor a nossa vida na terra

Esta diferenciação ética entre criador e criaturas não é uma fiscalização fria e inexpressiva. Antes pelo contrário, é o que nos convida a experimentar o mundo como "algo mais do que um problema a resolver; um mistério gozoso que contemplamos na alegria e no louvor" (no ponto 12). Os contornos definidos que separam criador das criaturas e criação não são um pretexto para nos isolarmos, mas uma possibilidade de prazer diferenciado e ajustado para nós.

4. O Papa acerta quando demonstra que para falar é preciso fazer antes o trabalho de casa

É verdadeiramente assinalável por parte do Papa Francisco uma vontade em perceber do assunto da ecologia junto de pessoas que sabem tecnicamente mais, mesmo quando não concordam teologicamente com ele. Quando se lê a encíclica, nota-se que há muito trabalho de casa a ser feito no Vaticano, com atenção prestada a estudos, à voz dos cientistas, e por aí fora. O mesmo se aplica com alguns piscares de olho a tradições religiosas não-católicas.

5. O Papa acerta quando organiza o seu trabalho

O estabelecimento de 10 eixos para e encíclica, apesar de se prestar a discussões localizadas, é muito útil e competente: 1) a relação íntima entre os pobres a e a fragilidade do planeta, 2) a convicção de que tudo está interligado no mundo, 3) a crítica do novo paradigma de poder vindo do avanço tecnológico, 4) o convite ao entendimento alternativo da economia e do progresso, 5) o valor próprio de cada criatura, 6) o sentido humano da ecologia, 7) a necessidade de debates sinceros, 8) a grave responsabilidade da política internacional, 9) a cultura do descarte, e 10) a proposta de um novo estilo de vida.

6. O Papa acerta quando recupera a crença na existência da sabedoria humana

Trazer a questão da sabedoria para a ecologia é dos passos mais corajosos de toda a encíclica. De certeza que irritará os mais materialistas, que materializam tudo excepto coisas simples como a diferença entre ser sábio de ser tolo. Ao mesmo tempo, o Papa Francisco sabe que a omnipresença de informação faz parte da grande poluição dos nossos dias. Não é só o cinzento da atmosfera das grandes cidades, é também o cinzento da atmosfera dos nossos corações soterrados e distraídos em informação digital. "Gera-se um novo tipo de emoções artificiais, que têm a ver mais com dispositivos e monitores do que com pessoas e a natureza" (no ponto 47).

7. O Papa acerta quando afirma que a existência de pessoas é um facto positivo

Para os que fogem do incómodo assunto de nascerem seres humanos, eis Francisco em grande forma: "Em vez de resolver os problemas dos pobres e pensar num mundo diferente, alguns limitam-se a propor uma redução de natalidade" (no ponto 50). Cínicos, run for cover! Por outro lado, a vida humana é colocada em causa com o apoio de muitos que se acham os maiores defensores da criação. Dá-lhe com força, Francisco! "Às vezes nota-se a obsessão de negar qualquer preeminência à pessoa humana, conduzindo-se uma luta em prol das outras espécies que não se vê na hora de defender igual dignidade entre os seres humanos" (no ponto 90).

8. O Papa acerta quando diz que vale a pena conversar mais

É necessidade pôr as necessidades mundiais a conversar umas com as outras. As dos ricos do Norte com as dos pobres do sul. "As exportações de algumas matérias-primas para satisfazer os mercados no Norte industrializado produziram danos locais [no Sul]" (no ponto 51).

9. O Papa acerta (e muito!) por falar de pecado (ainda que timidamente)

O Capítulo II chama-se "O Evangelho da Criação" e é aquilo que provavelmente mais se aproxima de uma hamartiologia (o Priberam não tem unhas para esta guitarra). O que é que hamartiologia quer dizer? Hamartiologia é o doutrina do pecado. O Papa Francisco explica bem que: "a existência humana se baseia em três relações fundamentais intimamente ligadas: as relações com Deus, com o próximo e com a terra. Segundo a Bíblia, estas três relações vitais romperam-se não só exteriormente, mas também dentro de nós. Esta ruptura é o pecado. A harmonia entre o Criador, a humanidade, e toda a criação foi destruído por termos pretendido ocupar o lugar de Deus, recusando reconhecermo-nos como criaturas limitadas. Este facto distorceu também a natureza do mandado de «dominar» a terra (Génesis 1:28) e de a «cultivar e guardar» (Génesis 2:15). Como resultado, a relação originariamente harmoniosa entre o ser humano e natureza transformou-se num conflito (Génesis 3:17-19) (no ponto 66)." É mesmo isto! O domínio que nos foi dado foi tornado pelo nosso pecado num abuso. Não é possível fazer ecologia a sério sem esta dose rudimentar de teologia. O Papa ajuda-nos a compreender esta lição. "A crise ecológica é um apelo a uma profunda conversão interior (pág. 217)."

10. O Papa acerta quando faz do descanso uma questão ecológica

O Papa recupera também o Sabbath como parte de uma ecologia integral. O merecido descanso que a natureza nos pede, não pode ser um merecido descanso que negamos a nós próprios. "O ser humano tende a reduzir o descanso contemplativo ao âmbito do estéril e do inútil, esquecendo que deste modo de tira à obra realizada o mais importante: o seu significado (no ponto 237)."

11. O Papa acerta quando distingue criação da natureza

"Na tradição judaico-cristã, dizer «criação» é mais do que dizer natureza, porque tem a ver com um projecto do amor de Deus, onde cada criatura tem um valor e um significado" (no ponto 76). E logo a seguir, no ponto 78, vai ao cerne da questão: "o pensamento judaico-cristão desmistificou a natureza. Sem deixar de a admirar pelo seu esplendor e imensidão, já não lhe atribui um carácter divino. Deste modo, ressalta ainda o nosso compromisso com para com ela."

12. O Papa acerta quando lembra que o melhor do mundo não exclui a teodiceia

Teodiceia é a doutrina que trata de como um Deus bom pode permitir a existência de mal no mundo que criou (está no Priberam uma definição mais fraquinha). O Papa aponta a complexidade de um mundo que pede que invistamos nele, "onde muitas coisas que consideramos males, perigos ou fontes de sofrimento, na realidade fazem parte das dores de parto que nos estimulam a colaborar com o Criador (no ponto 80)." Esclarecimentos destes mostram-nos as intersecções entre hamartiologia e ecologia.

12. O Papa acerta ao mostrar que o trabalho já existia no Paraíso

O Papa Francisco aplica as lições do mandato cultural de Génesis 1:28, um assunto muito frequente nos púlpitos protestantes, que pede pela nossa: "capacidade de reflexão, o raciocínio, a criatividade, a interpretação, a elaboração artística, e outras capacidades originais [que] manifestam uma singularidade que transcende o âmbito físico e o biológico" (no ponto 81). E mais: "A interpretação do conceito de ser humano como senhor do universo é entendê-lo no sentido de administrador responsável (no ponto 116)."

13. O Papa acerta quando diz que a lógica de tudo é Cristo

Há uma razão para a existência da criação: "A meta do caminho do Universo situa-se na plenitude de Deus, que já foi alcançada por Cristo ressuscitado, fulcro da maturação uinversal" (no ponto 83). Tudo o que existe, existe em função da existência de Cristo. That's it! Por causa disso, no ponto 85 a natureza ocupa uma função é traduzir a existência de Deus (como explica Romanos 1).

14. O Papa acerta quando percebe que sem Trindade não há nada para ninguém

A nota trinitária no ponto 99 e 100 é fantástica: "Uma Pessoa da Santíssima Trindade inseriu-se no universo criado, partilhando a própria sorte com ele até à cruz. (...) Assim, as criaturas deste mundo já não nos aparecem como uma realidade meramente natural, porque o Ressuscitado as envolve misteriosamente e guia para um destino de plenitude. As próprias flores do campo e as aves que Ele, admirado, contemplou com os seus olhos humanos, agora estão cheias da sua presença luminosa." No ponto 238 diz que é preciso "ler a realidade em chave trinitária".

15. O Papa acerta quando diz que a tecnologia pode ser um ídolo

O Papa deixa claro que o desenvolvimento da tecnologia é uma bênção divina. Mas aponta prudência porque "é preciso reconhecer que os produtos da técnica não são neutros, porque criam uma trama que acaba por condicionar os estilos de vida e orientam as possibilidades sociais na linha dos interesses de determinados grupos de poder" (no ponto 107). Esta é uma recomendação que precisamos todos de ouvir, quando saltamos precocemente para novos hábitos tecnológicos apenas porque podemos. Por exemplo, os pais que viciam os seus filhos nos diabólicos tablets, alguma vez pararam para pensar que o facto de poderem dar não tem de significar que devem dar? Nenhuma tecnologia é neutra. Os evangélicos, que desvalorizam as imagens, são talvez as maiores vítimas desta tragédia tecnológica. As nossas igrejas, originalmente orgulhosas da sua nudez iconográfica, parecem hoje Wortens de terceira categoria, com o seu desfile agreste de ecrãs, instrumentos musicais e powerpoints. Se eu fosse católico romano, faria xixi pelas pernas abaixo de tanto rir das piruetas que os Reformadores estão a dar no túmulo. O Papa, com razão, diz que "a permanente novidade dos produtos se une a um tédio enfadonho (no ponto 113)". As igrejas evangélicas que hoje se consideram na ponta tecnológica são aquelas que ficarão demodé mais rapidamente. Têm um prazo muito apertado para estarem actuais. Amanhã já são yesterday's news. Por outro lado, a bebedeira tecnológica dá-nos a ideia que podemos tudo o que nos passa pela cabeça: "parece não ser possível, para uma pessoa, aceitar que a realidade lhe assinale limites (no ponto 204)."

16. O Papa acerta quando diz que não há ecologia sem família

No capítulo "Uma ecologia integral" Francisco explica que não é possível fazer bem às florzinhas ao mesmo tempo que se faz mal à família. O respeito à família é fundamental para um mundo cuidado. Para isto, é preciso libertar a família das possibilidades tecnológicas que a re-inventam: "é necessário ter apreço pelo próprio corpo na sua feminilidade ou masculinidade, para se poder reconhecer a si mesmo no encontro com o outro que é diferente (no ponto 155)." Ou seja, se trato do meu corpo como ele me pertencesse, admitindo que lhe posso fazer o que bem quiser, acabo a levar a mesma lógica para o mundo. Não é à toa que os mais desequilibradamente ecologistas são ferozes defensores dos direitos LGBTQetc.

17. O Papa acerta quando denuncia a cientilatria

O Papa critica e com razão a arrogância dos cientistas e da academia no geral: "é indispensável um diálogo entre as próprias ciências, porque cada uma costuma fechar-se nos limites da sua própria linguagem, e a especialização tende a converter-se em isolamento e absolutização do prórpio saber (no ponto 201)."

18. O Papa acerta quando aponta hábitos simples e urgentes

O Papa diz com razão que os cristãos são chamados a um estilo de vida diferente, "profético e contemplativo, capaz de gerar profunda alegria sem estar obcecado pelo consumo" (no ponto 222). Sugere no ponto 227 que se ore antes (e depois) das refeições! Como é que é, meus amigos católicos? Quando vão começar a fazer o que vosso Papa diz? Eu já faço. E diz no ponto 237 que o Domingo é o dia preferencial para ir à missa por ser o dia do descanso. Meus amigos católicos que se rendem às facilidades dos sábados à noite, como é?

São 18 bons tiros! E no ponto 159 o Papa ainda arranja maneira de citar os Bispos portugueses. Não chega a ser um bom tiro mas quer ser, pelo menos, um tiro simpático. Prossigamos para os tiros ao lado (há uns quantos que parecem ser para outra carreira de tiro).

1. O Papa não acerta quando esquece alguma humildade

Dirigir-se "a cada pessoa que habita neste planeta" (no ponto 3), apesar de compreender no contexto romano (com a sua fixação na qualidade do que é univesal), não deixa de ser presunçoso. Claro que é incontornável que a responsabilidade do que o Papa diz, enquanto líder religioso mundial, vai muito além daqueles que se assumem católicos romanos. Mas é quase como se o Papa sugerisse uma meta de omnipotência comunicacional. O que se torna tosco quando, por exemplo, não tive durante este tempo nenhum amigo católico a dizer-me que tinha lido a encíclica. Roma com as letras é assim: pomposa porque, no fundo, são poucos os que as lêem.

2. O Papa não acerta por apostar tanto em Francisco de Assis

A inspiração constante a partir de Francisco de Assis, como exemplo de desapego e generosidade, desequilibra frequentemente o tom para um semi-panteísmo. Os da Reforma Protestante sempre foram especialistas em estilhaçar os exageros telúricos a que Roma muitas vezes se presta. Abreviando muito: como Roma tende a enfatizar o pecado como uma coisa que acontece sobretudo na carne das pessoas (sobretudo no domínio do sensual), a cabeça das pessoas e a criação tornam-se áreas aparentemente mais desinfestadas de pecado. Por isso, mais facilmente Roma cai em idealizações acerca da pureza do campo e da pureza dos nossos cérebros (olá, lei natural!), ao passo que os protestantes orgulhosamente constroem cidades e malham na reputação da filosofia. Apesar de o Papa dizer com a cabeça que o problema não começa nos lugares mas em nós, é como se com o coração acabasse a sugerir que a terra, bem abraçada por nós, nos pode dar já o paraíso. Essa é uma das razões que tornam Francisco de Assis frequentemente difícil de aturar. Dá vontade de dizer: casa-te lá com os passarinhos e deixa o povo da cidade trabalhar em paz! Talvez haja uma romantização do campo exagerada em frase como: "Não é conveniente para os habitantes deste planeta viver cada vez mais submersos em cimento, asfalto, vidro e metais, privados do contacto físico com a natureza" (no ponto 44).

3. O Papa não acerta quando resvala para o apocaliptismo

Dizer que a terra se está a tornar num caixote de lixo (no ponto 21) não merece de alguma qualificação quando nunca como hoje a terra foi tão apreciada e conhecida por um número tão elevado dos seus habitantes? E o mesmo se aplica ao desaparecimento de milhares de espécie vegetais e animais (no ponto 33). É verdade que hoje elas estão a deixar de ser visíveis. Mas é preciso dizer também que elas nunca foram visíveis para tantos como hoje. No ponto 163 diz que nos estamos a afundar "numa espiral de auto-destruição".

4. O Papa não acerta quando se esquece de falar de pecado

O Papa diz compreensivelmente que "Já se ultrapassaram certos limites máximos de exploração do Planeta, sem termos resolvido o problema da pobreza" (no ponto 27). Mas apetece perguntar de onde vem a expectativa que explorar o planeta nos leva necessariamente a ter a capacidade de acabar com a pobreza? Creio que é precisamente uma postura essencialmente materialista que nos pode levar a albergar essa esperança. Reparem, não estou a  dizer que os cristãos não devam ter a determinação de fazer do progresso uma razão para o fim para a o pobreza. O que estou a dizer é diferente: é precisamente um pensamento materialista (que descarta Deus da equação) que traduz o aumento do poder tecnológico como a possibilidade de acabar com a pobreza. Ou seja, os cristão devem lembrar que não é aquilo que acontece fora do homem, nas suas capacidades tecnológicas, que resolve todos os seus problemas. É a componente espiritual que torna complexa a resolução de problemas que, desprovidos dessa dimensão, parecem de resolução automática. Talvez tenha sido por isto que Jesus nos disse que sempre teríamos pobres connosco.

5. O Papa não acerta quando demonstra que não fez o trabalho de casa antes de falar

O capitalismo é tornado um atalho para tudo o que está de errado com o mundo. Talvez pudéssemos levar este dogma mais a sério se, com a mesma proporção com que se lhe dá palmadas, também se lhe reconhecesse as ocasiões que merece levar palmas. O capitalismo não contribui nada para o desenvolvimento da tecnologia que permite conhecer o estado do ambiente e protegê-lo? O capitalismo não contribui nada para a fruição do planeta por aqueles que nele habitam? São apenas dois exemplos mais óbvios. Volto a insistir numa coisa que escrevo há anos: a antipatia católica romana com o capitalismo, mais do que uma rejeição filosoficamente sólida, é um ressentimento: o capitalismo é uma coisa que acontece entre os protestantes. Eu tento evitar estes cheap shots, mas é difícil ouvir o Papa a malhar no capitalismo quando se intui o modo como Vaticano sai beneficiado por alguns dos aspectos menos inspiradores do sistema capitalista. Sou a favor que se dê palmadas no capitalismo, desde que, com a mesma razoabilidade, se lhe dê palmas quando se justifica (googlem para encontrarem católicos a apontar falhas no enquadramento teórico da leitura económica do Papa). O Papa, que tende a ser justamente detalhado em tantos aspectos, determinadamente vago sempre que fala em "enormes interesses económicos internacionais" (ponto 38).

6. O Papa não acerta quando falha nos graus de parentesco

O Papa escreve no ponto 96 que "em colóquio com os sues discípulos, Jesus convidava-os a reconhecerem a relação paterna que Deus tem com todas as criaturas" e cita para o efeito Mateus 11:25. Acontece que Mateus 11:25 não afirma semelhante coisa. O texto diz: "Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: «Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos.»" Já noutras ocasiões tenho assinalado que em lugar nenhum das Escrituras se afirma que Deus é pai de todos as criaturas. Deus ser o criador de todas as criaturas é diferente de dizer é pai delas. O que as Escrituras explicam é que, mediante a fé em Cristo, Deus torna-nos filhos por adopção. Entre outros textos, o de Gálatas 4:4-7 explica explicitamente: "Vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para remir os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adopção de filhos. E porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Abba, Pai. Assim, que já não és mais servo mas filho, e se és filho, és também herdeiro de Deus por Cristo." Dito de uma forma breve e objectiva: os filhos de Deus são aqueles que aceitam Cristo como Filho dele. Inferir além disto não tem qualquer suporte bíblico. No entanto, o catolicismo romano insiste nesta novidade sem suporte fundamentado. O povo, educado na ideia bonita mas sem base, bem diz que somos todos filhos de Deus. O problema é que não somos.

7. O Papa não acerta quando parece confundir cristianismo com pacifismo

É fácil falar na urgência de desarmamento (no ponto 175). A guarda do Vaticano já começou a dar o exemplo? É exasperante a facilidade com que as palavras do Bispo de Roma se confundem com as de um pacifista do Meo Sudoeste. O Papa diz que é preciso redefinir o sentido de progresso. Certo. Mas por quem? Por Roma? Por mim? Por quem, céus, por quem? Por uma iluminação qualquer a brotar na mente dos homens de boa vontade? É muito irritante o Papado ter sempre soluções para guerras nas quais recusa descer às trincheiras.

8. O Papa não acerta quando esquece que a lógica de tudo é Cristo

Já estou batido nisto: uma encíclica, mesmo quando cheia de coisas boas, é sempre estragada no final pela imposição artificial e desajeitada da mariolatria da praxe. Vejam bem, depois de todo o latim a explicar a lógica cristã do cuidado com a criação, aparece esbaforida Maria, como Rainha dela. Really? Eis o proverbial costume das invenções romanas que passam por verdades antigas: Maria é elevada ao céu (a sério, como, quando e onde?); é Rainha de toda a criação (a sério, como, quando e onde?); já tem o seu corpo glorificado (a sério, como, quando e onde? - como é possível se o único que tem o corpo glorificado é Cristo? O Juízo final já se deu para Maria, em jeito de privilégio cronológico?); e, por causa dela, parte da criação já alcançou toda a plenitude (a sério? Então para que é que o Papa se deu ao trabalho de escrever esta encíclica? É mudar-se para essa parte da criação e chamar-nos a todos para lá).

9. O Papa não acerta quando esquece que sem Trindade não há nada para ninguém

A pragmática católica é incansável. Há duas orações sugeridas aos leitores da encíclica. Uma para os que acreditem em Deus, e portanto possível de ser feita por judeus, muçulmanos e outros monoteístas (lá se foi a conversa da chave trinitária da realidade...). E outra mais específica para cristãos, vinda da mente de Francisco de Assis, com os seus típicos floreados campestres. Entre uma e outra, venha o diabo e escolha. E eu, que disse tanta coisa boa sobre o Papa Francisco, acabo nestas notas desconsolado...


terça-feira, setembro 08, 2015

Ouvir

Não foi o jardim que deixou de ser o lugar perfeito para Adão e Eva, mas Adão e Eva que deixaram de ser as pessoas perfeitas para o jardim.

O sermão de Domingo passado, o primeiro de uma série sobre a relação entre igreja e cidade, pode ser ouvido aqui.


segunda-feira, setembro 07, 2015

"Ética Cristã Hoje" de Alan Pallister e Samuel Cerqueira

Este ano a igreja de que faço parte, a Igreja da Lapa, passou seis meses de volta dos Dez Mandamentos. É estranho que hoje seja possível estranhar o facto de uma igreja passar meio ano de volta dos Dez Mandamentos. Mas é real: há igrejas que acham estranho uma igreja gastar tanto tempo de volta dos Dez Mandamentos. Não quero começar com este exemplo da minha igreja para dar a ideia que estamos no meio de um cataclismo e que, por alguma razão extraordinária, a minha igreja escapa dele. Onde quero chegar é aqui: a ausência de convívio das igrejas locais com os Dez Mandamentos significa que a ética é um assunto incómodo. Numa época demasiado encantada com a ideia que a boa comunidade cristã é aquela que atrai, os Dez Mandamentos são, como os miúdos hoje dizem, um valente turn off - parece que afastam as pessoas.

É significativo que hoje falemos de um livro que, o que tem para dizer, diz à custa dos Dez Mandamentos. E este é um elogio primeiro que quero fazer a "Ética Cristã Hoje" do Pr. Alan Pallister e do Samuel Cerqueira. Saúdo o desassombro de publicarem um volume com mais de 300 páginas para continuarem a dizer aquilo que já foi perfeitamente dito nos Dez Mandamento. Qualquer pessoa que leia este livro, por necessidade está a ler também os Dez Mandamentos. Conviver com "Ética Cristã Hoje" é conviver com o que Deus manda. E conviver com o que Deus manda pode ser hoje perigoso até no ambiente daqueles que supostamente querem fazer aquilo que ele diz.

Se não concordam, façamos um pequeno teste. Quantos de nós conseguimos dizer de cor os Dez Mandamentos? Eu consigo, mas reconheço, com vergonha óbvia, que só os decorei em vésperas do meu concílio examinador ao pastorado. Alguém que se sinta mais irritado por este teste pode protestar dizendo que ninguém se salva por saber de cor os Dez Mandamentos. Certo, concordarei. Mas responderei dizendo que é difícil que alguém, que tenha um prazer sincero na sua salvação, viva sem desejar fazer aquilo que o seu salvador deseja. E, nesse sentido, é absurdo dizer-se cristão e não querer praticar os Dez Mandamentos como prova do amor que se tem por Jesus. Não sou eu que ponho a questão assim. É o próprio Jesus vez após vez no Novo Testamento. Abreviando num verso apenas em João 14:21: "Aquele que conhece os meus mandamentos e os segue, esse é o que me tem verdadeiro amor. E aquele que me ama é também amado por meu Pai. Eu amá-lo-ei também e dar-me-ei a conhecer a ele inteiramente." Partindo do princípio que quando fala de mandamentos, Jesus não excluia os Dez do Velho Testamento, os Dez Mandamentos não são teoria à espera de ser praticada. Os Dez Mandamentos são o amor que temos a Cristo em acção.

Para assinalar o carácter saudavelmente perigoso de "Ética Cristã Hoje", referirei um aspecto por cada capítulo, que neste caso corresponde a cada um dos Dez Mandamentos. O meu objectivo é demonstrar como a reflexão do Alan Pallister e do Samuel Cerqueira é necessária para a nossa vida cristã. E cada aspecto referido, na sua aparente surpresa, serve para ilustrar que nos temos rendido ao facto de a ética ser um assunto incómodo - quanto menos se falar, melhor. No final de cada aspecto, termino sempre com uma frase irritantezinha, em jeito de refrão.

No Primeiro Mandamento, "não terás outros deuses diante de mim", o livro lembra que a base da nossa fé é uma adesão à existência de Deus. Essa adesão é tão grande que pode ser descrita como uma paixão por ele. Por isso mesmo a página 43 diz: "Quem se apaixonou pelo Deus de Israel só se pode relacionar, a nível humano, com alguém que se apaixonou pelo mesmo Deus." Ou seja, a partir do Primeiro Mandamento, a ética do nosso relacionamento matrimonial com alguém exige a mesma fé. Não é possível ser cristão e achar que a Bíblia nos permite casar com descrentes. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Segundo Mandamento, "não farás imagens de semelhança", o livro lembra que o sentido da exclusividade da adoração que Deus nos pede, bem exigente e sem ser facilitada por imagens ou esculturas, é respeitar que Deus é mais que zeloso - é ciumento (pág. 53). Deus está vivo e esperneia quando sente que o amor que lhe devemos pode estar a ser dividido com outra coisa qualquer, por bem-intencionada que essa coisa seja. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Terceiro Mandamento, "não invocarás o nome de Deus em vão", o livro lembra que "a questão não é não usar o nome de Deus, mas sim usá-lo com a devida seriedade" (pág. 77), isto porque "a palavra é sempre tratada como valor fundamental" (pág. 79). Onde é que está este cuidado com a palavra hoje? Deus parece servir de pretexto para termos o que queremos. Mas aqui a lógica é diferente. Seriedade parece um termo ultrapassado. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Quarto Mandamento, "lembra-te do dia de sábado para o santificares", o livro lembra que "a nossa sociedade necessita desesperadamente aprender que não é por pararmos um dia que alguma coisa fica por fazer" (pág. 93). E a crítica é mais contundente dando conta que, apesar de serem possíveis exageros legalistas quando ao Dia do Senhor, a realidade das nossas igrejas está no extremo oposto, de "respeito insuficiente pela igreja e suas actividades, devido a uma grande vontade de envolvimento em actividades de passeio e de diversão" (pág. 110). Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Quinto Mandamento, "honra a teu pai e a tua mãe", o livro lembra "quando os filhos tratam os pais como se a sua necessidade principal fosse essencialmente material como espelho da mentalidade dos pais na educação que receberam" (pág. 159). A consequência é o abandono nos lares de terceira idade ser uma inesperada justiça poética para gerações que funcionam sobretudo a partir do princípio de valorização económica. Ou seja, pais que educam os filhos a colocarem a profissão acima de tudo, são pais que, sem se aperceber, os ensinam a engavetá-los em lares quando se aposentam das suas profissões. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Sexto Mandamento, "não matarás", o livro lembra que a pena de morte pode ser um assunto que legitimamente divide os cristãos (pág. 174), demonstrando que historicamente o cristianismo não tem de ser considerado uma religião pacifista. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Sétimo Mandamento, "não adulterarás", o livro lembra como o divórcio, tornando-se frequente no meio evangélico, carece de ser enquadrado pelas Escrituras e não pela cultura. Ao mesmo tempo, afirma corajosamente como o celibato tem sido um dom mal-tratado (pág. 239). Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Oitavo Mandamento, "não furtarás", o livro lembra que, por exemplo, o cristão não deve sentar-se à mesa com alguém que também se diz cristão mas é reconhecidamente ganancioso (pág. 260). Como a vida social no meio evangélico ia ficar institucionalmente difícil se aplicássemos isto! Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

No Nono Mandamento, "não dirás falso testemunho", o livro lembra como uma visão demasiado flexível do que a verdade é pode conduzir a "racionalizações" perigosas (pág. 324). Com estas racionalizações, há cristãos a  arranjar maneira de justificar desavergonhadamente o que a Escritura diz preto no branco. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

Por fim, no Décimo Mandamento, "não cobiçarás", o livro lembra que se há uma palavra que define a nossa cultura actual, essa palavra é cobiça (pág. 339). Neste sentido, este tipo de ambição é comparada à atitude que Lúcifer teve de se tornar igual a Deus (pág. 356). Se tivermos em conta que é fácil ter a expectativa que Deus sirva de empregado para os nossos sonhos (basta pensar em alguma omnipresença da palavra sonhos neste sentido de materialização), estas palavras tornam-se acutilantes. Matéria bem perigosa em alguns contextos evangélicos hoje, não?

Esta é uma maneira muito breve de salientar as virtudes de "Ética Cristã Hoje" como um livro português que devia estar em todas as bibliotecas dos evangélicos portugueses (para não mencionar o seu carácter peregrino de edição - o nosso elogio à União Bíblia pela iniciativa!). Naturalmente, não significa que não encontremos aqui e ali a vontade de alguns assuntos estarem mais desenvolvidos ou, mesmo, discordaremos em algumas posições (senti necessidade de maior desenvolvimento ou mesmo alguma discórdia em assuntos como o dia do Senhor, a pena de morte, as técnicas de reprodução artificial, reestabelecimento ao ministério de um divorciado, o enquadramento teórico dos assuntos económicos, ou a possibilidade da mentira como acção ética mais responsável em casos de choque de interesses superiores). O que se assina, todavia, é a frescura de assumir uma maneira de viver concreta em função da personalidade do nosso Deus triuno. Façamos este investimento.


sexta-feira, setembro 04, 2015

Teledisco novo

Não há muitos muitos candidatos a Tom Petty português mas o Tiago Lacrau não se importava. O teledisco para "Os Meus Braços Estão Aqui", do disco "Sou Imortal Até Que Deus Me Diga Regressa", tenta num plano-sequência fazer a capa do "Damn The Torpedoes" ao mesmo tempo que diz à sua maneira "I Won't Back Down". Ser fiel é antiquado mas o Tiago Lacrau também nunca disse que era um rapaz moderno.



A realização é do Pedro Marcelino.

quarta-feira, setembro 02, 2015

O Compacto de Férias Voz do Deserto 2015

- Pela primeira vez desde 2004, não passámos uma semana de férias em Cabanas de Tavira. Como alternativa, investimos num lugar que tínhamos visitado o ano passado e gostado muito: a Ilha da Armona. É difícil resumir todos os encantos do lugar. Escolheria apenas um aspecto para descrever de quanto gostei: já não me lembrava o que era estar num lugar sem nada para fazer. Já ter lido, já ter dormitado, já ter passado pela net e, mesmo assim, não ter nada para fazer e fazer do nada para fazer descanso. Caramba - foi mesmo excelente. Ajuda o facto de ser uma ilha, de não haver carros, de quase não haver comércio, de haver um mar que não fica nada a dever para os trópicos com uma ria que nos servia à tarde, de termos um bungalow simples e funcional, de a areia estar por todo o lado misturada com o pinhal, de a urbanização ser uma mistura graciosa de construção ilegal com harmonia mediterrânica, e eu poderia continuar. Diria que a Ilha da Armona é um segredo mas já por lá andam uns quantos lisboetas cultos que farão do lugar um destino da moda em menos que nada.

- Passámos duas semanas em Água de Madeiros e alguns dos nossos miúdos três. Na primeira semana esforçamo-nos mais porque temos responsabilidades no programa do Acampamento. Na segunda descansamos mais porque as nossas responsabilidades são poucas. É praticamente impossível ser baptista em Portugal e não ter uma longa história com Água de Madeiros. Quando olho para a Conferência Bíblica que lá se faz (geralmente na terceira semana de Agosto), acredito que há muito de bom que ainda está por vir. Começa a haver ambição em convidar nomes de fora do país (foi um prazer estar com a Família Kroker pela terceira vez, e pela segunda ouvir o Luiz Sayão e o Alcir Souza) e, também por isso, creio que Água de Madeiros pode tornar-se mais do que um lugar para férias evangélicas. Portugal precisa de lugar destes como centros de recolhimento e sólida recalibragem teológica.

- Entretranto, estivemos duas vezes pela costa vicentina. Galé, Melides, Sines, Porto Côvo, Vila Nova de Milfontes. Nota-se o dominó gerado pelo efeito da recente popularidade da Comporta. As praias que há 25 anos tinham veraneantes do campismo ocasional ou em torno de algumas localidades em particular, enchem-se agora sobretudo de lisboetas ávidos pelo próximo novo paraíso alentejano. Por um lado, é interessante. O comércio torna-se mais criativo e há lugares a erguerem-se à custa de iniciativas valentes. Mas, por outro, ainda há alturas em que parece que fazer dinheiro dá trabalho e o turismo é tratado com demasiado improviso. Por vezes, em lugares como Sines, Santo André e Melides, neste passado fim-de-semana, por exemplo, um multibanco pode ser difícil de achar, um bar de praia fecha às 20h, e há restaurantes encerrados ao Domingo. É preciso mais do que isto.

- Entretanto, tenho em mente um novo livro para escrever. Chamar-se-á "Férias de Fornicação - a razão porque as férias dos adolescentes mostram a decadência da nossa cultura". Já tenho a teoria essencial plasmada na minha cabeça, resultado de ver a Costa Vicentina inundada de teenagers betinhos saídos dos seus colégios católicos conduzindo os bólides dos papás para se deitarem com quem lhes apeteça. O nosso maior problema não é a esquerda defender valores anti-cristãos. O nosso maior problema é a demografia da suposta direita conservadora viver de um modo requintadamente pagão.

- Comecei a ler um livro incrível sobre o New Hollywood - "Raging Bulls And Easy Riders". Digo que comecei porque a versão paperback que tenho só me dá os quatro primeiros capítulos. Encomendei pela Amazon a versão completa. À parte: saquei esta versão na Biblioteca de Oeiras que anda sempre a despachar livros que já não quer - volta e meia há umas pérolas. Daqui nasceu um exercício interessante. Comecei a ver cronologicamente os filmes que marcam o New Hollywood. Comecei pelo "Bonnie And Clyde" e pelo "Easy Rider". Gostei de ambos sem demasiados amores e acho que percebi o modo como contribuíram para uma nova respiração para o cinema americano. Mas creio que é na leva seguinte que virão as verdadeiras obras-primas, com o Scorsese e o Copolla a chegarem-se à frente.

- Se tivesse apenas de escolher um cantor para este Verão, diria que foi o Ryan Adams. Há uns tempos tweetei: "Ashes and Fire do Ryan Adams não falha. Agosto em Ryan Adams state of mind para provar que o Inverno está sobrevalorizado na country music." É isto. Vi o concerto do Ryan Adams no youtube em Glanstonbury e fiquei sem dúvidas que é o nosso homem.

- Continuo a gravar discos. Neste Verão meti-me em dois discos novos que ainda não sei como vão acontecer. Um deles é um disco muito virado para dentro, para o bairro onde cresci e para a partida daqueles que amo, como a minha Tia Rute. Precisava de um produtor de sons de dentro e o Luís Gravito (aka Cão da Morte) foi o homem. O outro é um disco de estalo na cara, das Borboletas Borbulhas. É um disco de escarrar rápido e bazar ainda mais depressa. Precisava de um produtor de sons de fora. O Bruno Mira (de Cast A Fire e de Fellow Man) foi o homem. Ainda andamos a gravar. Assim que houver novidades, espalho. E, com isto, o "Sou Imortal Até Que Deus Me Diga Regressa" ainda não morreu - esta sexta-feira há teledisco novo.

- Entretanto o Tweeter dá em 2015 um pouco do que os blogues davam em 2003. Até o Maradona posta abundantemente! Se queres perder leitoras, fala contra o aborto. É o que tenho feito.

- Ainda falando de aborto: e não é que o Miguel Vale de Almeida, a Rita Ferro Rodrigues e a Fernanda Câncio juntaram-se os três à esquina, a tocar a concertina, a dançar o solidó, trocando teorias acerca deste vosso querido que vos escreve? A apresentadora de televisão dizia que "não há pachorra para gurus cool". O nosso Harvey Milk foi mais literário: "A figura do tele-evangelista mascarado de rockeiro e muito dentro da cena só fascina mesmo quem vive na necessidade de procurar novidade constante. Nunca percebi o interesse por aquela personagem. Nada de genuíno, tudo máscara e artifício - como aliás se percebe pelo texto, um exercício de contorcionismo. De resto, é cómico, como uma cómoda de velha senhora num apartamento clean." Já a jornalista limitou-se a um comentário mais lacónico: "os inquisidores tb queimavam os hereges para lhes salvar a alma. tudo por puro amor." Será que posso usar estas descrições para fins de promoção pessoal?

Ouvir
O sermão de Domingo passado, pregado pelo Mark Bustrum na Igreja da Lapa, pode ser ouvido aqui.