Credo provisório desta semana
Eu sou "uma mentalidade fortemente anti-ecuménica", um polido escarnecedor de Fátima, um tratante calvinista.

Do vício
A revista "Pais e Filhos" está para as mulheres como a Playboy para os homens.

Rubrica: em quem votará Bob Dylan?
Falando sobre Johnny Cash disse Al Gore em 2003: "He was to the left of me on many issues". Parece que mesmo que o Homem de Negro ainda por cá andasse nem Kerry lucrava. Aqueles que dormem no Senhor de tudo estão já perdoados.

A bolsa
Muito do que era a atitude de Jesus em relação à economia pode ser aferida no facto de ter confiado as questões financeiras do seu ministério a Judas.

Derradeira pergunta
O jmf arreliou-se comigo acerca das presidenciais americanas e disparou: "Antes de tão apressadamente ires votar Bush, não queres averiguar primeiro em quem votam Dylan, Cohen e Cave"?
Esta questão passa a merecer uma rubrica aqui na Voz do Deserto: em quem votará Bob Dylan?


A ilustração é do meu amigo Paulo.

Pergunta 3
Esta chega-nos directamente das Escrituras, dos Cantares de Salomão, capítulo 9, versículo 8: Temos uma irmãzinha que ainda não tem seios; que faremos a esta nossa irmã, no dia em que for pedida?

Pergunta 2
Um festival de cinema alternativo não é uma espécie de tuning para intelectuais?

Pergunta 1
Que mortos hão-de chorar aqueles que nunca leram Sophia de Mello Breyner Andresen?

Depois de um poste em tom exageradamente intimista a referência ao pormenor quotidiano da vida litúrgica
Eu estava distraído durante a oração. Até que me apercebi que o pecador confessava as suas faltas. As minhas pernas, que até então abanava relaxadamente, imobilizaram-se. Podem os músculos de um homem repousar quando se ouvem palavras de arrependimento?

Nos intervalos de desenterrar cadáveres sou um pai tão palerma quanto todos os outros
E sei de umas bochechas que estão quase a romper de tantos beijinhos que levam.

Somatos é que paga
Aceitem isto de um rapaz religioso que não mente: este blogue é obrigatório.

Revista blogosférica
- O meu amigo Tiago Ramos fez o seu próprio blogue. Comungou comigo a adolescência a ouvir o "Vivo" dos Ratos de Porão.
- O meu amigo Lucas afinou o corte do seu antigo paletó para um blues descalço.

Da servidão
A esta altura interessa-me a auto-referência. O que por aqui se lê é feito com a farinha dos pães ázimos (prefiro o "asmos" da tradução de Almeida). Aqueles que os judeus comiam para recordar a sua escravatura no Egipto. Isto é literatura para quem já teve de viver sem os direitos laborais defendidos.

Na grafonola toca "He Touched Me" do Elvis
Hey mr. DJ, why don't you rock my soul?

Cinco boas razões para votar Bush
Dave Matthews, John Mellencamp, Moby, Eddie Vedder e os REM votam Kerry.

Nada a condenar
Tive uma namorada que me acusava de tomar sempre o partido dos outros. Parece que, quando relatava algo desejando encontrar em mim um aliado contra o mundo conspirador, eu optava por alinhar no conluio. Meus estimados leitores, isto não é defeito. Nem feitio. Apenas predestinação. Até Jesus encontrou boa-vontade em Pilatos.

Bem-aventurada indústria discográfica
Nick Cave tem um disco novo. O do Waits chega em Outubro. Cohen quase, quase. O Dylan lança uma autobiografia. Só faltava ressuscitar o Cash.

Divindade pagã feminina
No restaurante duas jovens senhoras aguardam ser atentidas. Uma não pedirá nada uma vez que trouxe de casa uma sandes embrulhada em papel de prata. Come-a com desenvoltura. Harmonia até. Não precisa de ementa nem de livro de reclamações. Uma mulher a sério providencia a sua própria refeição. E transforma-a num altar.

Fosse eu Adão
A Vanda e a Patrícia estavam no seu intervalo de almoço. Traziam os uniformes vestidos - na parte de trás da bata os seus nomes bordados. Qualquer transeunte mais atento poderia ousar chamá-las. Excepto eu, que não recebi ordem nenhuma de Deus para apelidar os seres viventes.

Dedicatória
Já me deixei de dar parabéns aos blogues que cumprem aniversários. A menos que, por uma razão qualquer, me apeteça fazer elogios fúnebres. É o caso agora da minha amiga Raquel. Que escreve coisas destas: "Hoje à noite vou com os meus colegas de trabalho tocar às campaínhas em apartamentos de desconhecidos e fugir. Nunca mais chega a hora de saída."

Uma prova da decadência ocidental
Uma das provas da decadência ocidental está na obrigatoriedade que sentimos em simpatizar com as namoradas dos nossos amigos. A última vez que simpatizei com a namorada de um amigo meu casei com ela. Poucas coisas nos devem merecer tão rasteiro nível de solidariedade quanto as paixões dos homens.
Vejamos o exemplo de Natã. Este profeta falou metaforicamente ao Rei David tentando alertá-lo para os resultados lamentáveis da sua virilidade. Homens demasiado activos no baixo ventre não têm discernimento para artifícios linguísticos. "Tomaste a mulher de Úrias, o heteu, para ser tua mulher". Quando não há entrelinhas até o mais miserável pecador cai de joelhos.
Dizem que o fim dos tempos vai ser próspero em rupturas conjugais. Não junte o homem o que Deus separou.

Um relato nocturno
Quando dei por mim, na noite em que prenderam o Mestre no jardim, estava mais próximo de Tomé do que de Pedro.

Cristas
Não vai longe o tempo em que andei pelo punk-rock. Os céus sabem o quanto suspirei por um moicano. Mas rapazinhos com hábitos eclesiásticos não podem ir de cabelo arrepiado para a Escola Dominical. O maior arrojo foi a orelha furada aos 18 anos, o que não constituia grande surpresa para uma congregação dos subúrbios.
Hoje qualquer menino de 11 anos exibe uma crista. Por cada pêlo que aponta para o firmamento uma lâmina se crava na minha consciência. Torturada por um passado demasiado ordeiro.
Já soou o segundo toque para os tímidos. Só os que fazem gazeta podem almejar aos desníveis capilares.

Uma fórmula
Era-me útil citar Santo Agostinho. E adicionar um episódio quotidiano para reforçar a ideia de que a luta entre o espírito e a carne é dura mas necessária.

Uma virtude
Recebo um convite lúbrico irrecusável que obriga a confrontar-me com uma das minhas maiores virtudes. Nos domínios da sensualidade abençoou-me o Senhor com a cobardia. Devo explicar-me.
Na minha adolescência mais tardia rondava uma amazona nas imediações. Por motivos que me são ocultos encontrava eu graça aos seus olhos. Ao mesmo tempo que distribuia erecções pelo arraial a moça provocava-me a fuga. O que na altura me parecia ausência de coragem própria e consequente opróbrio privado, tornou-se mais tarde límpido - Deus protegia-me.
Sou um sem-abrigo em Sodoma. Dá para ir escapando de uns incêndios tramados.

Traidor
Se algo divino houve na carreira de Dylan pouco teve a ver com a militância passageira de "Blowin' In The Wind". Poder ser chamado de "Judas", isso sim, faz parte da substância celestial que volta e meia toca os poetas.

Vontade
O que me agradaria que fosse encontrado nas linhas que escrevo seria restos de ossadas humanas.

Assunto
O escândalo é ser alguém com um Fiat Punto cinza e menos de 30 anos a gastar tanto tempo escrevendo sobre o pecado. Simplesmente precisamos de um assunto na vida. E não é necessário que um anjo nos visite para encontrarmo-lo.

Pronúncia
Se uma pessoa não tiver a dicção mais apropriada é possível ao orar dizer "filhos teus" e parecer que disse "filisteus".

Brasil
Não é fácil ser evangélico em Portugal, tendo hábitos de leitura, e apreciar tudo o que nos chega do Brasil. Uma onda anda aí a molhar muita gente enaltecendo os tesouros literários transatlânticos. Aceito-os, regozijando-me no Senhor. A unção evangélica canarinha é apenas uma pequena parte do todo. Ebenézer.
Conheci o Jorge Cardoso através de um e-mail. Foi amável com este blogue. Enviou-me o seu livro:
"Mental trabalhava como coveiro, uma vez o bispo perguntou: por que cavas tão fundo? Ele disse que ninguém volta para reclamar."
Na criação, quando Deus chegou abaixo do Equador, foi um mãos-largas.

Explicação
Não devo ser repetitivo. Para não esgotar a paciência da congregação. Mas este é um blogue sobre a morte. Já o tenho escrito. Há que reabilitar a necrologia. A bem da eternidade das nossas almas.

Serviço fúnebre
"Yeah, I wanna be well" (Ramones, Rocket To Russia).

Famílias que partem cedo demais
Morreu Johnny Ramone. Falta só o Tommy.

Pensão barata
O meu mais querido dinamarquês ameaça contra a possibilidade de uma pessoa, na falta de assumir uma posição, se tornar uma mistura de várias personalidades. Como Legião. Aquela série de demónios que ocupava o desgraçado gadareno. A esse valeu-lhe Jesus. Expulsou a diabretada para uma vara de porcos que se despenhou colina abaixo (o Messias pouco se importava para os direitos dos animais).
Fernando Pessoa e restantes hóspedes mentais que se cuidem.

Ausência
Chego ao David Byrne com 26 anos de atraso.

Uma nova rubrica sobre a ignorância nacional à volta do protestantismo
Um infeliz jornalista distingue "cristãos" de "pentecostais". O Google, meu prestável pecador, o Google!

Roupas no altar
Domingo que passou fui ao púlpito muito mal vestido. A pregação foi elogiada. Sentia-me, todavia, em vestes impuras. Israel dava importância ao fato dos sacerdotes. Felizmente que Jesus não preocupou a igreja com estas minudências têxtis. Careço de uma espécie de actualização neo-testamentária. A minha cabeça anda algures entre a Fashion TV e o Pentateuco.

Quando leio Kierkegaard
Leio Kierkegaard no hospital enquanto espero pela consulta da minha filha. Leio Kierkegaard antes de preparar o sermão do próximo Domingo. Leio Kierkegaard ao mesmo tempo que ouço o Prince.

Versículo
Quem nunca ouviu Wu-Tang Clan não merece viver num país industrializado.

Um ano de perplexidade
Os leitores são pacientes comigo. Sabem que eu gosto de me armar em João Baptista e dizer umas coisas entre a ameaça e a profecia. Um blogue que se constrói de vaidades e penitências. Mas isto não é o melhor desta história. O melhor desta história é o José e o seu Guia dos Perplexos. Que eu não conhecia e passei a conhecer. Um amigo novo. A distância teológica é irrelevante perante o escândalo de nos sentirmos irmãos.

A aflição do reverendo
Em todos os discos Missy Elliot agradece a Jesus, à sua igreja baptista e respectivo pastor. Isso não a impede de cantar sobre as dimensões do seu rabo, ejaculação precoce e brinquedos sexuais a pilhas.

O Barnabé
Fez um ano.

Tímida, demasiado tímida



Vão por mim. A menina Madonna tem muito a aprender com o Apóstolo Jorge Tadeu.

Do caderninho
O pregador na reunião de oração das quintas-feiras elogiou o meu uso constante de um bloco de notas. Fui exemplo dos fiéis. Mal sabem eles o que escrevo neste caderninho. Nem só de boas aventuranças vive a pena.

Eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei...
O Pedro Mexia fala sobre judeus. E relembra-me as razões que me levaram a imitá-lo querendo ter o meu próprio blogue.

Fraqueza calvinista com efeito secundário alfabetizador
Devo ser sincero. Peguei no Beckett por causa de uma fotografia sua. Aquele rosto merecia ser lido. Andei com "O Inominável" debaixo do braço durante as férias. Trouxe alguns pensamentos soltos. Mas nada se compara ao retrato. Para mim a literatura ainda precisa de umas boas gravuras. Sou protestante mas sensível às imagens.

Cautela
As pessoas que esbanjam ética são perigosas.

Antigas certezas
Duas mulheres. Mães. Dentro de cada uma a certeza de que a outra não usa da pedagogia apropriada para com a sua prole. A crença de que os filhos dos outros são sempre mal-criados é ancestral.

Jonas e o grande peixe no meu peito
Ontem a minha filha vomitou em cima de mim. Senti-me uma qualquer praia não muito distante de Ninive.

Benditas manchas
Imaculada é a toalha da mesa depois de sair da máquina. São dignos de admiração os homens que revelam contrapartidas. Heidegger e o partido nazi. Lutero e os judeus. Kazan e o senador MacCarthy. Mas há mais e mais próximos. O Ricardo Araújo Pereira faz rir como poucos e assina também textos para o HermanSic, o pior programa de televisão no ar. O Bruno Sena Martins tem um dos melhores blogues do mundo e está atracado à miséria ondulante do Borndiep. Esta é a humanidade à qual me orgulho de pertencer.

No meio do seu retiro o místico deixa escapar
Tenho saudades das notas de quinhentos.

Às vezes nascer nos bancos da igreja dá nisto
"I'm a dirt talkin' beer drinkin' woman chasin' minister's son", Alice Cooper em "Guilty" (do disco "Alice Cooper Goes To Hell").

Dos rendimentos
Os ímpios precisam de conhecer a história de Ananias e Safira. No tempo da primeira comunidade cristã de Jerusalém os bens eram partilhados entre todos os crentes. Até aparecer um casal que tentou guardar para si parte substancial do lucro da venda de um terreno. Pedro não estava para brincadeiras:
- Ananias, por que encheu Satanás o teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo, e retivesses parte do preço da herdade?
O desgraçado caiu redondo no chão. Circularmente morto. Veio Safira, a esposa, tão ou mais mentirosa que o marido. Foi pelo mesmo caminho.
O Novo Testamento não fala de mais nenhuma igreja que tenha seguido semelhante prática económica. A propriedade privada deixou de ulcerar os presbíteros.


"Eis aí à porta os pés dos que sepultaram o teu marido, e também te levarão a ti". (Actos 5:9)

Do satanismo bem intencionado
Kierkegaard propõe outra visão sobre Fausto: aquele que se entrega de peito aberto à fruição de todo o pecado possível na esperança de sair desiludido.

Peridiocidade recomendada
Há pessoas que só devemos encontrar nos casamentos dos amigos.

Lista maldita
Big Boi dos Outkast consegue fazer discos esteticamente irrepreensíveis ao mesmo tempo que grava o seu filhinho a dizer palavrões. A boa arte é muitas vezes um mero relatório das nossas transgressões.

Um lar no livro do Génesis
Isaque teve um filho peludo e outro lisinho. Virilmente preferia o cabeludo. Rebeca, a mãe, compadecia-se do depilado. A família é uma matéria de tal forma inflamável que até um pêlo pode servir de rastilho.

E sobra
Cinco semanas chega.