sexta-feira, março 30, 2012

Amanhã
"Ricardo Araújo Pereira pelos ateus, sheikh David Munir pelos muçulmanos, professor Peter Stilwell pelos católicos, rabino Eliezer Shai di Martino pelos judeus, pastor Tiago Cavaco pelos baptistas. Todos num Clube da Palavra Especial Deus, este sábado, dia 31 de Março às 24h00, no Canal Q." A ironia é que fui à boleia da minha católica preferida (a Flannery, claro) para falar de Deus e acho que não me saí grande coisa.

quarta-feira, março 28, 2012

"This Momentary Marriage" de John Piper
Para verem o tipo de imparcialidade que sinto em relação ao John Piper quando o menciono em SDB chamo-o de John Papa. Por isso fica já claro: na minha opinião John Piper é o maior pregador vivo, um teólogo rigoroso que lucrou de um período académico na teologicamente liberal Alemanha para atestar que o progressismo religioso é biblicamente estéril e um entusiasta pela obra missionária. Se hoje já é um nome incontornável da Cristandade imaginem o que umas décadas vindouras podem fazer. Agora que já raiei a idólatra veneração dos santos, aproveito para dizer que acabei de ler "This Momentary Marriage", um volume que trata sobre casamento.
Tendo em conta que li com imenso prazer "The Meaning Of Marriage" do Tim Keller, um colega de Piper na Gospel Coalition (e que com D.A. Carson completa a minha trindade teológica viva), alguma comparação pode ser útil. John Piper não escreve bonito, raramente estabelece pontes com autores contemporâneos (apesar de cada capítulo partir de uma citação de Dietrich Bonhoeffer) e tem um ritmo curto e vincadamente lógico. Ou seja, para alguém como eu, cozido no forno pós-moderno das nossas universidades europeias, há uma secura estética que pode ser pouco atraente. São muito poucas as ocasiões que John Piper alivia o tom mais professoral usando uma história pessoal ou uma amostra graciosa de empatia. Nesse aspecto, Piper não escreve para convidar ou sugerir. Ele explica. O que não o impede de reconhecer com sinceridade quando as coisas são claras ou obscuras.
John Piper é um escritor poupado de cartas na mesa. Ao segundo capítulo o leitor já leu repetidamente a tese que vai orientar todo o volume. Não há surpresas nem twists nos seus livros. Em "This Momentary Marriage" a mensagem principal é: "The ultimate meaning of marriage is to dramatize on the earth the covenant-keeping love between Christ and his church." Esta austeridade não o proíbe de reconhecer as dinâmicas misteriosas da vida de um cristão deste lado da Ressurreição. Um dos triunfos de John Piper é fazer da firmeza hermenêutica uma abertura ao deslumbramento. Basta ouvi-lo pregar para ficarmos surpreendidos que o rigor silogístico possa provocar arrepios. Só um homem como ele cunharia a expressão "hedonismo cristão" sem cair no ridículo.
O casal de namorados entusiasmado poderá achar mais graça ao risco corrido pelos Driscolls em "Real Marriage" ou embevecer-se mais com a doçura apologética dos Kellers em "The Meaning Of Marriage". Mas essas não são razões para ignorar a força de "This Momentary Marriage". Porque o casal de namorados precisa desesperadamente de se apaixonar igualmente por Deus. E essa é uma área de especialidade de John Piper.

terça-feira, março 27, 2012

"A Verdade e a Vida" - intervenção no encontro Fé e Ética
Tendo o tema "A Verdade e a Vida" é impossível para um Pastor Baptista não dançar-lhe o ritmo que o próprio Jesus lhe deu quando se apresentou com essas credenciais. Estas palavras estão no Evangelho de João, capítulo catorze, verso seis. "Disse-lhe (a Tomé) Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim." Assim. A frio. Uma afirmação que parece uma lâmina. Dois mil anos depois há a possibilidade de nos parecer mais cortante ainda. É uma coisa extraordinária. Citando C.S. Lewis, ou Cristo era um louco narcisista ou era aquilo que dizia que era. O caminho, a verdade e a vida. Como pode parecer óbvio para todos, tenho o meu salário, a minha família e a minha vida apostadas na segunda hipótese. E não me tenho dado mal. Sobretudo porque não sou avaliado pela capacidade pessoal de me manter fiel a esta convicção mas porque é a própria fidelidade de Jesus que me capacita e convence. As pessoas coerentes são sensatas mas são as carentes que são santas. Por isso, e perdoem o facto de não conseguir falar sem acabar em sermão, não fui eu que cheguei à "Verdade e a Vida". Foi a "Verdade e a Vida" que chegaram a mim.
Por outro lado, se pensarmos no tema mais geral, "Verdade ou Consequência", não me parece descabido aplicá-lo à oportunidade de vos falar esta manhã. Valerá a pena apreciar uma Verdade que não tenha Consequência? Ou uma consequência que não tenha verdade? Uma questão de forma e conteúdo, de substância e estilo. Mais uma vez devo ser-vos sincero: havendo valor na minha experiência pessoal ele estará no que a anima, a insufla, como diz o ruah do Génesis, o sopro de Deus que dá alma ao nosso corpo. Um pregador evangélico apenas pode inspirar na medida em que expire, transmita o que o sustém. Talvez essa seja a razão principal porque os Protestantes têm dificuldade em falar de si próprios para preferirem concentrar-se na Palavra de Deus. A Bíblia é a versão corrigida das nossas melhores aspirações.
A minha casa é um casamento feliz de caos e contentamento. Somos seis, três contra três na matemática dos géneros. Três mulheres e três homens. Como a Bíblia explica que os filhos são a herança do Senhor eu e a minha mulher, Ana Rute, olhando para a diminuição do rendimento dos nossos salários concentramo-nos no pagamento que pode ser a genuína e empenhada confusão que as nossas crianças nos trazem. E nem sempre é fácil viver de um orçamento destes. Mas a nossa gratidão tende a concentrar-se no extraordinário fenómeno que é fazerem-se pessoas das pequenas crias que alimentamos. E, a pouco e pouco, somos de facto surpreendidos. A Maria de quase 8 anos já escreve as suas histórias e inventa canções. No culto doméstico temos de a impedir de ler mais do que 3 versículos se não tínhamos a nossa casa transformada em escola islâmica. A Marta, de 5, é a mais preciosa auxiliar de educação aos irmãos, sempre disposta a entreter e aturar os rapazes com uma rara dedicação. O Joaquim, de 4, faz dos bancos de plástico uma bateria improvisada onde raramente lhe falta o ritmo (vou usá-lo nos meus concertos). O Caleb, de quase 2, é um déspota no que a atenções domésticas diz respeito, mostrando que a vontade é uma coisa que se cultiva e corrige desde as fraldas. Os filhos mostram-nos que em qualquer momento Deus consegue fazer de um jardim selvagem uma cidade. Só é preciso um pouco de paciência e fé.
A igreja onde sirvo não é assim tão diferente da minha casa. É um lugar para saber mais, louvar melhor e trabalhar muito. Aos Domingos não chegamos a meia centena de pessoas entusiasmadas pela graça de Deus. Tentamos manter os olhos em Jesus porque é isso que nos permite ser realistas e ambiciosos. Fazemos um esforço para partilharmos uma fé que não é em nós mas nos resultados da Cruz. Tentamos não ficar desatentos às implicações da Ressurreição na vida dos outros, mesmo daqueles que não crêem nela. Por isso, e apesar da Igreja se reunir numa cave, habitamos um buraco com pretensões de chegar alto. Para um reencontro com o Senhor que esperamos, nosso noivo temporariamente distante. Os cristãos não são pessoas anestesiadas à espera de uma reanimação sobrenatural. São cheias de desejo. Daquele tipo dos amantes afastados. E não tarda o noivo chega (a Bíblia corrige-nos: não é a noiva que é esperada mas o noivo, Cristo).
Não sei se esta é uma maneira convincente de, falando da minha experiência, aliar Verdade a Vida. Para mim tem sido a suficiente. A vida não é uma questão de sucesso mas de satisfação. E, graças a Deus, para aí chegarmos estamos sempre dependentes.
Ouvir
O uso do nome de Deus só é válido quando se vive sob o Seu poder. Os cristãos são instrumentos da vontade do Pai, não seus proprietários. O Senhor pensa em serviço enquanto os homens em franchising. Somos meios, não fins. E a nossa autenticidade é o contrário da nossa autonomia.
O sermão de Domingo passado aqui.

segunda-feira, março 26, 2012

Teresa Olazabal
Os protestantes desconfiam das pessoas que quando falam de fé se concentram nas obras. É um facto com quase 500 anos. Por isso podem imaginar a tendência para não sentir grande emoção quando a conversa é ajuda aos pobres, assistência aos marginais ou investimento em filantropia (e podem imaginar também o consequente risco de menosprezar a importância destas coisas numa fé que não lhes é indiferente). Quando a generosidade do Padre Miguel Ferreira o levou a convidar-me para participar no encontro Fé e Ética soube que ia ser acompanhado pela Teresa Olazabal, que não conhecia. Vi que o currículo era essencialmente esse e por isso não estava à espera da pessoa que encontrei. Gerou-se uma boa oportunidade para que alguns dos meus preconceitos fossem desafiados.
A Teresa tem décadas de serviço a pessoas a quem é difícil (e às vezes pura e simplesmente desaconselhável) servir. Sem-abrigos, drogados, prostitutas, doentes terminais, deficientes profundos. Nos quinze minutos da sua intervenção concentrou-se em três histórias. Contadas sem uma centelha de vaidade ou orgulho. Três relatos de alguém que se mete na rua por puro apego às palavras que conhece de Jesus. Já lhe tentaram bater, já lhe abusaram da hospitalidade, já lhe destruíram o trabalho. E ela, mais do que apresentar sucessos, diz que reza. E as poucas centenas que a ouviam tinham a certeza que sim. Porque há coisas que não se fingem e que nem sequer alguém tentaria fingir. Sentimos que a força dela é arrastada por uma outra maior ainda.
Mesmo quando a Teresa enfatizou coisas da sua fé com as quais só posso discordar (acreditar que a hóstia é o corpo de Cristo ou orar a Maria) não interrompeu o atropelamento à minha vaidade, que se preparava para falar logo a seguir. Quando ia começar sentia-me arrasado porque nada do que poderia partilhar da minha vida se comparava (ou melhor, apesar da discrepância, a palidez da minha experiência a rigor é sustentada pelo mesmo poder que sustém a da Teresa, os resultados é que são diferentes). Todos nos apercebemos que não estávamos na presença de uma pessoa qualquer. E isto não é um louvor à Teresa Olazabal mas ao Deus dela.

sexta-feira, março 23, 2012

Para o sermão deste Domingo
É preciso a presença de uma criança para Jesus explicar a imensidão da missão que cabe aos discípulos, distraídos no pouco das suas grandes ambições (...) Oferecer um copo de água pode merecer uma recompensa eterna. Não é o tamanho humano das ofertas mas o preço espiritual que nelas existe. E outra vez nos apercebemos que Cristo é o câmbio de toda a existência. Toda.
Hoje no Jornal de Negócios

quarta-feira, março 21, 2012

Agenda
Próximo Sábado vou participar no 10º Encontro Fé e Ética sob o tema "Verdade ou Consequência", às 11h30 no auditório da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Às 19h estarei na Igreja Baptista do Estoril a ser entrevistado. Apareçam.

terça-feira, março 20, 2012

Rafael
O quadro de Rafael não é só acerca do Monte da Transfiguração mas também sobre a cura do jovem lunático. Ao juntar os dois episódios o pintor faz uma opção estética que é feliz também em termos pastorais. Porque a tendência mais fácil é separar o sublime do sórdido a pintura de Rafael é uma afirmação teológica potente. Temos Cristo num vislumbre de glória divina raro ao mesmo tempo que nos apercebemos do que acontece de terrível abaixo com a possessão demoníaca do rapaz. Não sabemos se a preocupação de Rafael era religiosa mas conseguiu pintar a imagem de uma maneira cristã que por vezes nem os teólogos conseguem.

Ouvir
Quantos de nós não educamos os nossos filhos para lhes sermos indiferentes? Encontrando na paz exterior dos nossos tranquilos relacionamentos um emblema trágico da apatia à Eternidade. Mais triste que o pai que chora pelo filho é aquele que não o faz.
O sermão de Domingo passado aqui.

segunda-feira, março 19, 2012

Tevê Pascal
O Ricardo Gross já tinha elogiado o Walking Dead a partir de uma reedição do western. Sendo que a terra peregrina agora estava ampliada a todos os destroços da civilização americana. Não me parece descabido. E numa época em que a televisão definitivamente vinga o cinema o Walking Dead é a única série que sigo (embora me pareça que a minha mulher tire mais satisfação de Downtown Abbey). A primeira temporada começou melhor do que acabou mas o primeiro episódio da segunda restaurou-me o ânimo. É verdade que há um ritmo televisivo que parece telenovelizar à força a dinâmica da acção (muita conversa desnecessária, angústias existenciais forçadas, défice de real action) mas ainda assim os episódios nunca se tornaram dolorosos de assistir.
A minha tese, ao fim da segunda temporada, é que há um equívoco funcional na relação entre vivos e mortos-vivos. O verdadeiro zombie de Walking Dead é a arrogância moral dos sobreviventes. A série podia ser uma parábola animada sobre as eventuais limitações da ética perante o caos social mas a maior parte das vezes não ultrapassa uma superficial crítica humanista. Os heróis de Walking Dead estão continuamente desejosos de se manterem puros em relação à vil tarefa de sobreviverem nos despojos da civilização. É este tipo de certeza empírica acerca dos malefícios da defesa da vida humana que faria do suicídio colectivo um hino filantrópico. Os autores da série deviam ter lido sobre Guerra Justa antes de distribuírem armas pelos resistentes. Assim não é raro que me sinta filosoficamente mais próximo dos maus da fita que das vozes da razão da temporada. Shane era meio troglodita mas leria Schopenhauer, Kierkegaard e Nietzsche com maior utilidade que qualquer dos inocentes restantes.
Por outro lado, os zombies são as personagens mais suportáveis de Walking Dead. Temos um asiático ágil que se apaixona por uma menina de igreja que sucumbe facilmente à luxúria, temos uma loira que se descobre sniper perfeita, temos uma criança com instintos sociopatas, temos um veterinário que interpreta biblicamente o renascimento dos mortos, temos um velhote com uma cabeça ocupada por idealismo e um chapéu de pesca, temos um polícia permanentemente atormentado pelo que deixa viver e pelo que deixa morrer, entre outros. Mas a coroa da chatice é Lori, a mulher do polícia. Nem o facto de ter adulterado na sua ausência (quando o julgava morto, é certo) a impede de reagir com escândalo a qualquer gesto mais pragmático do marido. Com vivos destes...
Não é só no ecrã que os mortos voltam sazonalmente à vida. Não há vestígios de cultura humana que não tenha pensado sobre a possibilidade da Ressurreição (ou, menos corajosamente, na eternidade da alma). Um filme de zombies não é propriamente um programa para a Quaresma mas sempre pode levantar algum pó. Daquele tipo a que supostamente voltamos mas que a fé nos diz que não é capaz de nos segurar para sempre.

sexta-feira, março 16, 2012

A mesinha de cabeceira de Barack Obama
Comover-me já não é grande critério porque, como diz a canção do Vitorino escrita pelo António Lobo Antunes, hoje em dia comovo-me por tudo e por nada. Mas seria desonesto ocultar a lavagem do meu rosto em lágrimas que acontecia quase sempre que pegava para ler "Gilead" de Marilynne Robinson. É sem dúvida o melhor livro de ficção que li nos últimos tempos, totalmente merecedor do excesso de louvor crítico que faz questão de incluir na capa, contracapa e primeiras páginas. Teve o Pulitzer e por mim merecia todos os prémios que esta Terra tenha para premiar o artesanato livreiro.
O meu companheiro Luís de Sá, que está a estudar Teologia nos Estados Unidos para servir a Igreja Católica, ofereceu-me este livro como prenda pela minha consagração ao Ministério Pastoral, juntamente com outro de um Jesuíta (que lerei a seguir) e um disco soberbo da Iris DeMent. Os meus dias têm sido mais doces pela generosidade do Luís que me deu a conhecer Marilynne Robinson, como ele disse, uma calvinista with a twist. Não é estranho que um objecto que me chega das mãos da amizade, nas mãos da amizade termine. As condições biográficas tornam-se sem dúvida literárias.
Referir a Flannery O'Connor de pouco serve porque receio passar a vida a usar o nome dela em vão. Por isso, suportem mais uma vez. Marilynne Robinson tem em comum com Flannery, pelo menos, a religião como chão narrativo ("Gilead" é a história de um Pastor Congregacional, filho e neto de Pastores Congregacionais) e o regionalismo como programa universal (enredos em lugarejos como pretexto para uma reflexão sobre a vida). Depois há muitas diferenças porque em Robinson a acção tende para a harmonia onde em O'Connor resvala para a fractura. Ao facto não será estranho que Robinson prefira Karl Barth (e daí uma suavização teológica dos abismos) quando O'Connor cita Santo Agostinho (para antagonizar o esplendor da verdade contra as trevas). De qualquer modo, as duas mulheres fazem da fé cristã o berço de personagens que, lutando consigo próprias, fazem as pazes com os leitores. Quão rara e preciosa é esta literatura.
Nota final ao facto deste livro ser um dos preferidos do Presidente Obama. Não é difícil especular porquê. Há raça e esperança, dois ingredientes fundamentais na mística barackiana. E eu, que se fosse americano não votaria Obama, posso ainda assim fazer do carisma presidencial mais uma razão para aconselhar todos a lerem este livro. Na Casa Branca há um exemplar na mesinha de cabeceira. Estão à espera do quê?

terça-feira, março 13, 2012

Desenhos
No dia em que o mundo perder a parcialidade dos olhos de um pai deixa de merecer ser desenhado.



Caleb's missing.
Ouvir
A Transfiguração, em toda a sua sublime excepção, é também fundamento do mais corriqueiro da nossa existência. Sabemos que é este Deus transcendente que nos envolve para que o mais necessário aconteça dia a dia: ouvirmos Jesus.
O sermão de Domingo passado aqui.

sábado, março 10, 2012

Este Março



O Evangelho de Março preenche-nos as lacunas.

sexta-feira, março 09, 2012

A minha crítica a "Real Marriage" de Mark Driscoll e a "The Meaning Of Marriage" de Tim Keller
Talvez não seja inteiramente justo falar do "Real Marriage" do Mark Driscoll ao mesmo tempo do "The Meaning Of Marriage" do Tim Keller. Mas acontece que as suas edições foram próximas e li-os simultaneamente. O facto de comparar um com o outro deve servir mais para ilustrar o meu interesse em aprofundar o assunto do casamento do que publicitar preferências sobre dois pregadores actuais que admiro. Por isso não procuro fazer avaliações ao ministério destes dois homens mas sobretudo tentar partilhar as melhores leituras sobre o matrimónio.
Mark Driscoll não é um escritor. É um pregador de impacto, com muito estilo e risco, como que fazendo justiça à velha tradição americana dos fire and brimstone sermons. É certo que Driscoll é muito mais que choque apocalíptico (esse campeonato parece-me ganho pelo Paul Washer) e por isso vale a pena reconhecer o percurso que tem feito em quase 20 anos de pregação. A sua Igreja, Mars Hill, é um lugar de teologia sólida e alcance missionário ambicioso. É por isso absolutamente injusto reduzir Mark aos clips do Youtube menos prudentes. Mas também é verdade que o terreno volta e meia escorrega e, quem o segue, conhece-lhe os mais ou menos regulares pedidos de desculpa públicos acerca de algo que escreveu ou disse sem pensar muito antes.
Mark Driscoll já escreveu uns quantos livros e eu, só tendo lido este, creio que a sua bibliografia será principalmente uma aglomeração razoavelmente bem sucedida dos temas dos seus sermões. Isso seguramente sente-se em "Real Marriage" onde não existe um rumo narrativo muito nítido mas um encadeamento de opiniões, experiências e conselhos. Que de modo algum desclassificam o livro de interesse, antes pelo contrário. Destaco o relato da vida pessoal do casal Mark e Grace positivamente pela aproximação sincera e persuasiva que atingem nos leitores, negativamente pela imprudência de fazerem de alguns das suas experiências, bastante questionáveis nas lições que delas tiram, momentos demasiado relevantes das suas convicções (as visões de Mark ou a obsessão pelos efeitos do "sexual abuse"). Todavia, dificilmente alguém pode ser indiferente à força e despojamento da Família Driscoll como meritório exemplo cristão num assunto que os tempos amedrontados nos fazem mais olhar para os nossos telhados de vidro que ousar dar testemunho.
Nota última para os rumores acerca do Capítulo 10, onde o texto se vira para o que um casal cristão fiel poderá ou não ou deverá ou não fazer na cama. Ia escaldado e talvez por isso tenha achado que não há razão para tanto barulho. É, no entanto, certo que os conselhos dados pecam mais por defeito que definição, uma vez que a leitura crítica dos Driscolls em relação aos novos fenómenos íntimos (have I just said fenómenos íntimos?) é demasiado superficial. Dizer que a Bíblia não condena alguma coisa sem oferecer mais contexto sobre a coisa de que se fala está mais próximo da preguiça que da prudência.
Tim Keller é outro campeonato porque além de ser um pregador intelectualmente estimulante (have I just said intelectualmente estimulante?) é também um escritor. Este é o terceiro livro que leio de Keller e é precisamente por ser um discípulo de C.S. Lewis que não pode ser posto no mesmo patamar do Mestre. Os seus livros são todavia uma das melhores coisas a acontecer a este Mundo nos dias que correm. E o encanto de Keller é conseguir atingir um apreço semelhante nas pessoas que têm a mesma fé cristã dele e nas outras também. O que naturalmente chateia outros tantos.
Curiosamente, The Meaning Of Marriage resulta de uma série de sermões que Keller deu na Redeemer Presbyterian há mais de vinte anos, ao passo que Real Marriage de Driscoll foi escrito primeiro para agora resultar numa série de sermões que dá um pouco por todos os Estados Unidos. O livro de Keller parte da passagem do capítulo cinco da Carta aos Efésios e não dispersa muito, mostrando que bons contornos fazem bons objectos. The Meaning Of Marriage é convincente e bonito, gracioso e profundo, convidativo e ortodoxo, e outros pares de adjectivos que nos dão vontade de ir à florista mais próxima para comprar ramos para a nossa esposa (este é um momento de confissão de pecados porque se a minha mulher me avaliasse pelas flores que já lhe ofereci o nosso casamento era um deserto no lugar do recomendável jardim). Ou seja, a cena recomendável na dramaturgia matrimonial dos nossos dias.
Nota derradeira e pessoal. O que é melhor que um bom marido a escrever bem sobre o casamento? Um bom marido e uma boa mulher a escreverem bem sobre o casamento. Acontece. Ambos os livros são escritos pelos casais (embora Kathy Keller não tenha a proporção de Grace Driscoll). E o que é melhor que um marido esforçado a ler um bom livro sobre o casamento? Um marido esforçado e uma mulher esforçada a lerem um bom livro sobre o casamento. Acontece. Lá em casa foi assim.

quinta-feira, março 08, 2012

A cruz estava no Céu antes de estar no Calvário
"The cross, not an episode but an eternal mood in God's heart, not an incident of Christ's life, not an accident in His career, not just a moral spectacle to exhibit God's love, but a transaction founded in deep necessity, was in heaven before it was on Calvary", Robert G. Lee in "The Must of the Second Birth".

quarta-feira, março 07, 2012

Guarany
A uma casa de chá vai-se de colarinho abotoado.

terça-feira, março 06, 2012

Ouvir
O papel do sofrimento de Cristo que culmina na Sua morte é único e nenhum cristão se salva por sofrer imitando o sofrimento de Jesus. Mas é difícil que auto-negação e levar a cruz não impliquem sofrimento. Quem segue Jesus não deseja sofrer mas prepara-se para isso.
O sermão de Domingo passado aqui.

segunda-feira, março 05, 2012

Ana Rute
A mulher que por causa do Senhor Jesus o Criador escolheu para mim antes de dar origem a todo o Universo faz hoje 35 anos. Grão precioso numa eternidade de alegria.

sexta-feira, março 02, 2012

Para o sermão deste Domingo
Quando diz "se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me" Jesus não está a carimbar passaportes de peregrinos mas a avaliar a solidez da vontade de quererem viajar com Ele (...) Esperava-se que o libertador soltasse o povo do sofrimento, não que o trouxesse como requisito para aqueles que O aclamam (...) Deus encarna não para eliminar a dor do mundo mas para sofrê-La.
Amanhã
Os Lacraus tocam no Mexefest do Porto nos Maus Hábitos.

quinta-feira, março 01, 2012

J. Edgar
O que se passa com a biopics políticas? "J. Edgar" não foge ao que parece ser uma regra contemporânea: embrulhar vidas de pessoas controversas em cinema esquizofrénico para simular "perspectiva e imparcialidade". Foi péssimo com "Iron Lady" e, embora "J. Edgar" não seja tão mau, é farinha do mesmo saco.
A personagem principal a narrar é um dispositivo corajoso mas que não salva a amálgama. E trata-se menos do que é capaz o talento de Leonardo DiCaprio (o talento de Leonardo DiCaprio é capaz de muita coisa boa) mas do que o talento de Leonardo DiCaprio não consegue valer na ausência de um rumo para o filme. Calculo que não sejam assim tão poucos aqueles que, como eu, gostam mais de gostar de Clint Eastwood do que realmente gostam dele. Mas até esses poderão sair desiludidos com a confusão travesti que é "J. Edgar". Porque o ponto forte da história, a restituição de um olhar descomprometido a uma personagem comprometida (esta é outra conversa que agora não interessa desenvolver), sobrevive com dificuldade a tão má maquilhagem e à tendência gnóstico-pop de oferecer chaves de leitura a partir de revelações sexuais bombásticas.