A minha crítica a "Real Marriage" de Mark Driscoll e a "The Meaning Of Marriage" de Tim Keller
Talvez não seja inteiramente justo falar do "Real Marriage" do Mark Driscoll ao mesmo tempo do "The Meaning Of Marriage" do Tim Keller. Mas acontece que as suas edições foram próximas e li-os simultaneamente. O facto de comparar um com o outro deve servir mais para ilustrar o meu interesse em aprofundar o assunto do casamento do que publicitar preferências sobre dois pregadores actuais que admiro. Por isso não procuro fazer avaliações ao ministério destes dois homens mas sobretudo tentar partilhar as melhores leituras sobre o matrimónio.
Mark Driscoll não é um escritor. É um pregador de impacto, com muito estilo e risco, como que fazendo justiça à velha tradição americana dos
fire and brimstone sermons. É certo que Driscoll é muito mais que choque apocalíptico (esse campeonato parece-me ganho pelo Paul Washer) e por isso vale a pena reconhecer o percurso que tem feito em quase 20 anos de pregação. A sua Igreja, Mars Hill, é um lugar de teologia sólida e alcance missionário ambicioso. É por isso absolutamente injusto reduzir Mark aos clips do Youtube menos prudentes. Mas também é verdade que o terreno volta e meia escorrega e, quem o segue, conhece-lhe os mais ou menos regulares pedidos de desculpa públicos acerca de algo que escreveu ou disse sem pensar muito antes.
Mark Driscoll já escreveu uns quantos livros e eu, só tendo lido este, creio que a sua bibliografia será principalmente uma aglomeração razoavelmente bem sucedida dos temas dos seus sermões. Isso seguramente sente-se em "Real Marriage" onde não existe um rumo narrativo muito nítido mas um encadeamento de opiniões, experiências e conselhos. Que de modo algum desclassificam o livro de interesse, antes pelo contrário. Destaco o relato da vida pessoal do casal Mark e Grace positivamente pela aproximação sincera e persuasiva que atingem nos leitores, negativamente pela imprudência de fazerem de alguns das suas experiências, bastante questionáveis nas lições que delas tiram, momentos demasiado relevantes das suas convicções (as visões de Mark ou a obsessão pelos efeitos do "sexual abuse"). Todavia, dificilmente alguém pode ser indiferente à força e despojamento da Família Driscoll como meritório exemplo cristão num assunto que os tempos amedrontados nos fazem mais olhar para os nossos telhados de vidro que ousar dar testemunho.
Nota última para os rumores acerca do Capítulo 10, onde o texto se vira para o que um casal cristão fiel poderá ou não ou deverá ou não fazer na cama. Ia escaldado e talvez por isso tenha achado que não há razão para tanto barulho. É, no entanto, certo que os conselhos dados pecam mais por defeito que definição, uma vez que a leitura crítica dos Driscolls em relação aos novos fenómenos íntimos (
have I just said fenómenos íntimos?) é demasiado superficial. Dizer que a Bíblia não condena alguma coisa sem oferecer mais contexto sobre a coisa de que se fala está mais próximo da preguiça que da prudência.
Tim Keller é outro campeonato porque além de ser um pregador intelectualmente estimulante (
have I just said intelectualmente estimulante?) é também um escritor. Este é o terceiro livro que leio de Keller e é precisamente por ser um discípulo de C.S. Lewis que não pode ser posto no mesmo patamar do Mestre. Os seus livros são todavia uma das melhores coisas a acontecer a este Mundo nos dias que correm. E o encanto de Keller é conseguir atingir um apreço semelhante nas pessoas que têm a mesma fé cristã dele e nas outras também. O que naturalmente chateia outros tantos.
Curiosamente, The Meaning Of Marriage resulta de uma série de sermões que Keller deu na Redeemer Presbyterian há mais de vinte anos, ao passo que Real Marriage de Driscoll foi escrito primeiro para agora resultar numa série de sermões que dá um pouco por todos os Estados Unidos. O livro de Keller parte da passagem do capítulo cinco da Carta aos Efésios e não dispersa muito, mostrando que bons contornos fazem bons objectos. The Meaning Of Marriage é convincente e bonito, gracioso e profundo, convidativo e ortodoxo, e outros pares de adjectivos que nos dão vontade de ir à florista mais próxima para comprar ramos para a nossa esposa (este é um momento de confissão de pecados porque se a minha mulher me avaliasse pelas flores que já lhe ofereci o nosso casamento era um deserto no lugar do recomendável jardim). Ou seja, a cena recomendável na dramaturgia matrimonial dos nossos dias.
Nota derradeira e pessoal. O que é melhor que um bom marido a escrever bem sobre o casamento? Um bom marido e uma boa mulher a escreverem bem sobre o casamento. Acontece. Ambos os livros são escritos pelos casais (embora Kathy Keller não tenha a proporção de Grace Driscoll). E o que é melhor que um marido esforçado a ler um bom livro sobre o casamento? Um marido esforçado e uma mulher esforçada a lerem um bom livro sobre o casamento. Acontece. Lá em casa foi assim.