sexta-feira, junho 29, 2012

Ontem à noite
Uma alegria muita grande durante a Assembleia. O Manel e o Pedro explicam porque querem ser baptizados. Treze pessoas nos seus vintes e trintas ouvem-nos. É um momento formal a rebentar de conteúdo. E é por isso que há uma estirpe particular de alegria, aparentemente domada na quietude das formas de uma Assembleia de membros de uma Igreja Baptista. Uma tranquilidade habitada por um motim de contentamento. Só Deus sabe o que quererá fazer desta comunidade. O que acontece no Presente já nos satisfaz, numa coreografia serena de prazer.

terça-feira, junho 26, 2012

Ouvir
Os religiosos do tempo de Jesus discutem tanto a sua autoridade porque estão determinados a resistir-lhe. Sermos uma geração de tantas questões pode significar mais desconforto que busca de conhecimento.
O sermão de Domingo passado aqui.

segunda-feira, junho 25, 2012

Tim
Absolutamente secundário:
- os Rancid serem da segunda vaga do punk (quando os puristas só podem ouvir a primeira)
- a tatuagem na careca do Tim (que nos distrai)
- a ética etílica no cantar que pode parecer que o que se diz não é para levar a sério.
Absolutamente essencial:
- o Tim Armstrong é dos melhores escritores de canções dos últimos 20 anos (I'll stand by my words)
- a maneira como se toca uma canção não é a essência da canção (embora possa ser muito importante - comparar esta versão com a original)
- o rock que me agrada gravita entre dizer que está tudo mal (escola Sabbath) e dizer que, não estando tudo bem, as coisas hão-de se arranjar (escola Velvet).

quinta-feira, junho 21, 2012

Dia histórico

Passei grande parte da minha vida numa Igreja que pertence à Convenção Baptista Portuguesa, filha da Convenção Baptista do Sul dos Estados Unidos. Claro que em Portugal esta herança nunca passou por questões raciais americanas, graças a Deus. A Igreja Baptista de S. Domingos de Benfica, da qual faço parte, não pertence à Convenção. O que não impede de celebrar o dia histórico desta terça-feira. Fred Luter foi eleito Presidente da Convenção Baptista do Sul, o primeiro Presidente negro. Os cristãos às vezes falham. Mas, pela graça de Deus, arrependem-se. E corrigem os seus maus caminhos.

quarta-feira, junho 20, 2012

 Belos belicosos
Talvez um dos aspectos mais irritantes de uma boa parte da cristandade seja a sua obsessão por se mostrar serena. A ideia que o testemunho correcto de um cristão passa por obliterar qualquer traço de agressividade. Ouvimos o que se tornou um refrão popular: um cristão não se afirma pela negativa. E suspeitamos que esta tranquilidade obrigatória tenha mais de anestesia que de paz interior.
Não digo isto para branquear os pecados terríveis que já cometi nestes domínios. Tenho um cadastro tristemente longo de falta de compaixão, de discórdia sem fraternidade, de puro desejo de me afirmar a qualquer custo e aproveitando as falhas dos outros. Tudo isto é mau. E tudo é vaidade. Mas o bebé não deve ir com a água do banho. As pessoas que, tentando emendar um passado de hostilidade, atenuam a importância dos assuntos que debateram, não revelam correcção mas erro maior: afinal de contas o que estava em causa nesses debates era sua afirmação pessoal e não a defesa do que era certo. Não falta gente que pede perdão pelas razões erradas e que abandona velhas opiniões não em favor de novas corrigidas mas por mero instinto de sobrevivência. Se dissermos que já não estamos a jogar tornamo-nos logicamente invencíveis.
Imaginem o fenómeno na História do Cristianismo. Imaginem as apressadas vozes dos ponderados a acalmarem calma ao Apóstolo Paulo. A Atanásio. A Agostinho. A Francisco de Assis. A Joana D'Arc. A Wycliffe. A Lutero. A Calvino. A William Carey. A Spurgeon. A Chesterton. A C.S. Lewis. Essa cambada de belicosos.
Esta obsessão pela serenidade virá, eventualmente, de um divórcio subtil que se operou num determinado senso comum: verdade e intensidade estão cada uma para seu canto. Ganha quem defender a sua tese da maneira mais desapegada possível (ditadura da auto-ironia: check!). Existirá aqui alguns pós de Budismo turístico, suavizando os sabores fortes do judaísmo. Assim, mesmo no meio da fé cristã, erige-se um palco de reconhecimento de maturidade a todos os que falem baixo porque, neste entendimento, a real paz de espírito mede-se nos decibéis. Vale a pena voltar à Palavra. Jesus não disse para deitarmos para o lixo a noção de inimigos mas para amá-los. É substancialmente diferente.
O tipo de cristãos que me inspira notabilizaram-se também por, ao longo da História, se meterem em alheadas terríveis onde tinham de mostrar a sua fé pela negativa. Por alguma razão as primeiras afirmações de fé, que ainda hoje nos dão sustento, apareceram como reacção a heresias. Ao mesmo tempo estes homens respeitaram os seus adversários confrontando-os. Jogando do outro lado do tabuleiro. Foi assim que se tornaram personalidades importantes para o cristianismo mas igualmente para a cultura. Por detrás da obsessão contemporânea pela serenidade pode bem estar um desejo de rejeitar o conceito de adversário para assim poderem ser todos, sem regras nem maneiras, simplesmente aniquilados. Sempre que do outro lado há falta de comparência eu fico automaticamente vencedor.

terça-feira, junho 19, 2012

O Nadador
Segui a dica do Pedro Mexia num texto do Expresso de há umas semanas e vi "The Swimmer". Gostei bastante, apesar de antever os defeitos que o Pedro lhe aponta em relação ao conto original (que nunca li).
A mim, que me sinto menos atraído pela crítica social à burguesia suburbana americana e pelos toques surrealistas no progresso da narrativa, tocou-me a ansiedade da personagem, animada pela descoberta de um caminho marítimo para sua casa nadando de piscina em piscina até lá chegar. Há um encontro trágico-cómico entre o heroísmo de Vasco da Gama e o homem de que Chesterton falava que precisava de dar a volta ao mundo para descobrir o ser lar.
"The Swimmer" é um grande filme para contrapor à película de Verão. Aqui, por mais que se nade, a margem é pouco segura.


Ouvir
Queres mostrar fé? Perdoa as pessoas que te fizeram mal. Não com o sentido de superioridade moral de as colocares em dívida contigo. Com o sentido de perdão que Cristo ilustra na cruz. Um gesto em que pagamos nós mesmos pelo prejuízo que outros nos causaram.
O sermão de Domingo passado aqui.

segunda-feira, junho 18, 2012

Pastores
O Pr. Mark Driscoll tem razão quando escreve acerca da tontice que é o pavor dos novos Pastores com a palavra "Pastor". The word “pastor” is no longer fashionable for some—especially those who are young, arty, hip, cool, and/or are deeply committed to the trinity of skinny jeans, deep v-necks, and frosted hair. Subsequently, this tribe of “pastors” spends a lot of their time and mental energy trying to create for themselves innovative/cutting-edge/avant-garde/unique/relevant/hip/creative new titles. The result is often silly.
Desprezar o significado de "Pastor" é desprezar boa parte do que a Igreja significa na vida dos cristãos. E este não é um post sindicalista, a favor da corporação de quem o escreve. Antes de serem braços ou boca os Pastores são ouvidos. Não representam uma profissão mas a atenção à voz de Deus. É daí que vem o termo vocação.
Como diz a minha mulher













A Ria fica-nos tão bem.

sexta-feira, junho 15, 2012

Cabanas de Tavira não se gasta 4
- Consegui! Depois do almoço de ontem fui de bicicleta de Cabanas até à Fábrica onde, com a maré baixa, atravessei a Ria para uma Praia onde nunca tinha estado. Excepcional. Um cristão sabe que tem de ter os olhos abertos porque de cada vez que olha a Criação à sua volta junta-se a uma manifestação de louvor colectivo que todo o Planeta presta ao Criador. No Algarve a minha adoração aguça-se.
- Ao regresso, e a passar a Ria em maré baixa, o piso foi dos mais escorregadios que já alguma vez pisei. Um casal alemão com idade para serem meus pais estava parado com a senhora no chão. Perguntei se precisavam de ajuda (em inglês) ao que responderam que a mulher tinha acabado de cair e tinha partido a perna. Olhei e de facto do joelho para baixo já havia uma cor azulada que naquelas circunstâncias se torna sinistra. Já tinham pedido e a ambulância vinha a caminho. Disse-lhes que me ia certificar disso e deixei-lhes um "God bless you" que me pareceu que não entenderam. Ao chegar à margem o INEM não demorou muito e lá foram dois bombeiros para o meio do sapal, receosos daquela que ia ser uma travessia complicada pelo meio do lodo. Deus abençoe aquele casal alemão que rapidamente passou de uma vista do Céu algarvio para uma tremenda chatice. E Deus abençoe as pessoas que trabalham no INEM, são-nos bem preciosas.
- O João e a Filomena, da nossa igreja, visitam-nos. Embora a casa seja da Tia Lena, partilhei-a com eles com o orgulho que teria se fosse minha. É dessa maneira que a Tia Lena nos faz sentir aqui. Como se a casa fosse nossa. Por isso esforço-me por passar o deslumbramento que tenho por esta semana aos nossos amigos. Creio que o João e a Filomena, mesmo sem terem ido à Praia, terão saído fãs de Cabanas (e da varanda da Tia Lena em particular).
- Hoje depois do almoço permiti-me a viagem nostálgica à Praia Verde. O pinhal da Praia Verde ainda ribomba forte cá dentro, seguindo o eco da memória do Parque de Campismo que me marcou na infância. Aquele cheiro seco dos pinheiros misturado com o mar é uma coisa que devia ser patenteada, engarrafada e vendida em frascos, para os dias de demasiada urbanidade em Lisboa.
- Curiosamente terá sido o ano que li menos. Ou seja, li menos porque como do ano passado para cá ganhei uma rotina mais firme de leitura, noto que agora as férias não ganham o destaque de outrora. O que li em férias não se destaca para o que leio fora delas. O "God, A Biography" do Jack Miles, o "Brothers, We Are Not Professionals" do John Piper e o "Religião Para Ateus" de Allain de Boitton estão quase no fim. Os dois primeiros são pérolas, o último é daqueles que se lêem para se não perder totalmente de vista o momento agnóstico dos nossos dias.
- Amanhã, permitindo Deus, ainda daremos um bocadinho de praia e piscina aos meninos de manhã, antes de saírmos. A semana de Cabanas de Tavira chega ao fim e a nossa satisfação é grande. Sei que isto soa um bocado aos anúncios do Mourinho para o banco mas, de facto, temos um País formidável. Com botas de ouro e praias ainda melhores.

quinta-feira, junho 14, 2012

Cabanas de Tavira não se gasta 3
- A Tia Lena, receosa pela minha masculinidade, subiu a parada. Comprou uma Coronitas para me aproximar de um nível mais aceitável no que a cerveja diz respeito. Resultado: numas refeições é a bebida mexicana, noutras é a fiel Green.
- Troquei a praia a seguir ao almoço por uma volta de bicicleta. Já fiz uns quantos quilómetros e ontem cheguei quase ao fim da Ria. O meu sonho de Verão era conseguir chegar a Manta Rota para um banho e depois regressar triunfalmente, secando à velocidade do velocípede.
- Tavira agora tem um centro comercial com cinemas. Ontem à noite vimos o Prometheus. Not bad. Mas demasiado reminiscente do Alien, esse sim, a obra-prima. Gostei da persistência da fé no filme, ainda que validado pelo emocionalismo nostálgico da personagem principal. Hollywood ainda olha o cristianismo como uma religião de avós agarradas a relíquias.

terça-feira, junho 12, 2012

Cabanas de Tavira não se gasta 2
- A água continua gelada. Como o vento se levantou a estadia matinal na praia encurtou-se.
- Somos sete e a travessia da Ria faz-se através de dois barcos em constante rotação entre as margens. Mesmo que tentemos o contrário, o nosso grupo dá estrilho. Quatro crianças e três adultos. A Marta à saída da primeira viagem foi empurrada pela Maria e espalhou-se na berma da água. Nada de especial mas o suficiente para fazer o resto do caminho até à praia em choro.
- A seguir ao almoço, e enquanto comia cerejas, caíram os dois primeiros dentes da Marta. Os pequeninos, inferiores, da frente. Esta miúda é desassombrada, para a frente (mesmo tendo em conta as birras). Bochechava água para parar o sangue, vitoriosa e confiante. Dois de uma vez só.
- Como voltei a cortar o meu cabelo em casa, e ao Joaquim também, nestes primeiros tempos os penteados domésticos surpreendem-nos pelos seus ímpetos próprios. Quando o cabelo seca, e com o efeito viçoso do sal, pareço o Miguel Veloso nos treinos (que nos jogos aperalta-se mais). É para terem a dimensão do susto.
- Cabanas de Tavira é uma aldeia piscatória que ganhou músculo turístico. Por alguma razão insondável há um barquinho atracado no lado esquerdo da margem chamado "Lucifer 1". Terei descoberto o propósito missionário das minhas férias aqui?
- Eu gosto de britânicos mas, caramba, por que deixam os filhos tomar banho na piscina vestidos, de crocs e tudo? Quatro mini-bifes, brancos como a cal, a fazer figuras no meio do tanque com pouca noção que o ridículo vestido é provavelmente pior que o ridículo em pêlo. A Rainha os ajude.
- Uma das muitas desvantagens do casamento homossexual é que dois amigos já não podem fazer férias juntos sem a suspeita de serem amantes. A tolerância gay encafuou a estroina masculina na via obrigatória do romance.
Ouvir
O assunto principal da purificação do Templo não é uma aversão ao negócio mas a urgência do louvor. Não precisamos de ganhar rendimentos na entrada da igreja para sermos tão espiritualmente miseráveis quanto estes trapaceiros na entrada do Templo.
O sermão de Domingo passado aqui.

segunda-feira, junho 11, 2012

Cabanas de Tavira não se gasta
Nunca apanhei água tão fria em Cabanas de Tavira. Já devia esperar. Nunca a água esteve tão fria também em Santo Amaro e, mesmo contando com a grande diferença habitual de temperatura de uma para a outra, é por isso o próprio ano que está em causa e não o mar. Dois mil e doze ainda não nos deu um banho realmente mediterrânico, uma expectativa natural para o País que temos. Será que o clima ainda se recompõe até ao fim do Verão?
Mas Cabanas não se gasta. Mesmo sem um calor muito pronunciado este lugar continua a ser único. Almoçamos na varanda e nada há à frente da vista para a Ria. Bebo uma Super Bock Green, ou mesmo duas (céus, que excesso!) antes do almoço enquanto despachamos a refeição dos miúdos. Sei que para muitos cairei no ridículo mas para a mim a intenção de Deus era fazer da cerveja um ponto provisório do panaché. Também sei que o nome panaché é tenebroso mas as coisas são o que são e para mim nenhuma cerveja pura me sabe tão bem como uma cerveja adulterada por gasosa. Um tipo não pode ser a favor de uma doutrina sólida em todos os assuntos da vida.
Depois do almoço e enquanto os miúdos dormem volto à praia para fazer as minhas orações leituras. Quando regresso vamos à piscina, coisa que faço com cada vez menor prazer. Claro que com os meninos é precisamente o contrário e de bom grado trocavam a praia da manhã por piscina o dia inteiro. Eles passam uma hora lá seguida e quando saem da água o Joaquim vem com os olhos vermelhos do cloro e a Maria e a Marta a publicitar novas conquistas hídricas. A Maria, de facto, hoje mostrou-nos que já consegue boiar. O Caleb passeia na parte rasa da piscina com alegria mas obriga-nos a estar em cima do acontecimento até porque o desnível para a parte onde estão os irmãos pode dar-lhe um susto valente.
Voltamos a comer na varanda e passeámos na Avenida de Cabanas de Tavira. Como o ano passado viemos em Julho nota-se a diferença que esta época ainda está calma. Regressamos a casa, fazemos o culto doméstico na cama e finito. Claro que este milagre algarvio só é anualmente possível porque Deus anima a Tia Lena de generosidade e paciência. É a única pessoa do Planeta que vive connosco o bom, o mau e feio uma semana em cada doze meses.

sexta-feira, junho 08, 2012

Para o sermão do próximo Domingo
O que Jesus fez, amaldiçoando a figueira, não é distante que fará agora, purificando o Templo. Há uma continuidade na atitude do Filho de Deus. Há confronto com a aparência para revelar a verdadeira identidade. Por isso apercebemo-nos que a fome de Cristo por figos é semelhante à fome que agora revela por um louvor autêntico no lugar onde devia ser prestado: o Templo. Jesus continua a mostrar os dentes. É porque Jesus quer trincar alguma coisa de consistente que age da maneira como o texto bíblico nos mostra. Estes episódios de ímpeto do Messias, onde mostra uma face que pode parecer mais agressiva, são episódios de apetite. Deus está vivo e encarnado. Tem fome, esperneia e derruba objectos. É o tipo de atitude que sugere na cabeça dos seus adversários castigos como a crucificação.

Filhos
Se ontem apontava o que me parecem equívocos católicos, hoje vale a pena ler o texto do Albert Mohler (Presidente do Southern Baptist Theological Seminary), reflectindo sobre as vitórias e as derrotas protestantes acerca do planeamento familiar. Ao fazê-lo tece elogios à integridade da Igreja Católica Romana nestas matérias.
Na vida da minha família o contacto indirecto com a encíclica Humanae Vitae influenciou uma mudança de postura em relação a ter filhos. Os resultados estão à vista e contam-se, entre os Cavacos, em mais pessoas vivas. Agora veja-se a ironia: American evangelicals are rethinking birth control even as a majority of the nation’s Roman Catholics indicate a rejection of their Church’s teaching.
O meu pensamento em relação a ter filhos não é católico (creio que o uso do contraceptivos não é condenável em termos absolutos e que a Bíblia não exige aos casais que maximizem o número de filhos). Mas foi profundamente abençoado pela consistência, coerência e coragem que Roma assume num tema que infelizmente assusta muitos evangélicos.

quinta-feira, junho 07, 2012

Acerca do Feriado do Corpo de Deus
Nós, Protestantes, somos frequentemente acusados de literalistas. Como que, na ânsia de ler a Bíblia, não soubéssemos lê-la como deve ser, levando praticamente tudo à letra. Mas essa acusação só aumenta a surpresa quando nos apercebemos que a Igreja Católica leva à letra uma coisa que nos parece obviamente simbólica: que na Ceia do Senhor (Eucaristia, no termo do grego original e que a Igreja Católica Romana preserva) o pão e o vinho são a própria carne e o sangue de Jesus.
Não é o meu propósito agora resumir a discussão à volta da doutrina da Transsubstanciação, que a Reforma Protestante rejeitou. Tenho-me apercebido que muitos dos meus amigos católicos têm uma relação tão forte com esta convicção que quando falo sobre o assunto prefiro ser cuidadoso. Hoje, no feriado do Corpo de Deus (em que se transporta a hóstia para a rua, daí o nome) fica patente não apenas a tal, e indevida na perspectiva evangélica, interpretação literal de 1 Coríntios 11:24-25. Ao mesmo tempo, e parece-me mais intensa, é a relação emocional que os católicos romanos têm com a Eucaristia. Ou seja, mais que teológica, a Transsubstanciação é uma crença afectiva. Afinal, a missa gira à volta do acontecimento de tomar o corpo de Cristo. Essa é uma das razões que torna pobre, aos olhos dos católicos romanos, o serviço de culto protestante. O centro da adoração, na imensa diversidade da expressão evangélica, é a pregação da Bíblia. O que é manifestamente menos místico para as emoções católicas. Demasiado frio e racional até, nessa leitura. Num certo sentido, os protestantes não têm nada de especial no seu culto e não têm vergonha disso. Também porque acreditam que não é preciso alguma coisa externa vistosa para dar contorno ao que acontece espiritualmente (no fundo, algo que vemos como um pouco obsessivo em toda a coreografia católica). Um traço de carácter protestante passa desconfiar da imagem (a velha herança hebraica) para reconhecer-se sobretudo na Palavra. Daí nos parecer um pouco folclórico o aparato romano e estranharmos que os católicos se emocionem tão pouco com os ouvidos (quando a Bíblia diz que a fé vem pelo ouvir). Aliás, de alguma maneira os meu amigos católicos devolvem-me a desconfiança ironizando acerca das nossas capacidades oratórias (quantas vezes já ouvi a frase "quase que me convences" como se a persuasão não tivesse nada a ver com a fé).
Além do que nos parecem dificuldades de uma teologia da Transsubstanciação (a construção do conceito de sacramentos, o facto de até o Credo dos Apóstolos afirmar que Cristo está à direita do Pai incompatibilizando a estadia física nos elementos da Eucaristia, entre outros aspectos), acreditar nela transforma o modo como se olha para a Igreja. Uma Igreja que acredita que oferece fisicamente Cristo exorbita as suas competências, diremos nós Protestantes. E tende a confundir-se a si própria com Ele, a partir do momento que O manuseia. A frase de Carl Trueman é certeira: When we identify the church with the gospel, it would seem to me that Rome is the natural outcome, since, for Rome, the church is, in effect, the gospel.
Uma das diferenças centrais das Igrejas Protestantes para o Catolicismo é que elas não oferecem fisicamente Cristo mas simplesmente pregam o Seu Evangelho (o que de modo algum torna as coisas mais fáceis). Porque foi Cristo que nos deixou a Igreja e não a Igreja que nos deixou Cristo. Acreditar na Transsubstanciação é dar um passo no que nos parece um subtil mas sério equívoco. Com todo o respeito que este dia e o seu significado junto dos nossos amigos católicos nos deve merecer a nós, evangélicos.

quarta-feira, junho 06, 2012

Zeca
Mesmo sendo um fã relutante podem imaginar a honra que é ter um texto na reedição do "Traz Outro Amigo Também" do Zeca Afonso. Devo isso à generosidade do Gonçalo Frota. Aproveitei para falar da minha vida privada, claro está.

Em 1999 arranjei uma namorada formidável que Deus transformou em minha mulher. Sabemos a importância que esse tipo de mutações transfere para as bandas sonoras que a acompanham. Por isso não é de estranhar que, a partir do momento em que um CD de capa vermelha começa a circular pelos lugares do namoro, a música se tenha misturado com o prazer. "Traz Um Amigo Também" era o título do disco roubado da prateleira do que viria a ser meu sogro que agora embalava uma parte tão susceptível da minha existência. Num certo sentido, se nunca permiti namoro ao Zeca Afonso a verdade é que ele arranjou modo de se impor a mim através da minha namorada. Quem é que nestas circunstâncias estaria em condições de resistir-lhe?

terça-feira, junho 05, 2012

Ouvir
Que Jesus seque figueiras para nos mostrar os perigos de uma fé falsa não é estragar jardins. É salvar almas. E essa é uma opção prioritária no cristianismo. As coisas são importantes mas as pessoas são mais. Não nos deve repugnar que uma figueira seja uma metáfora para os espíritos dos homens porque os espíritos dos homens valem mais do que as figueiras.
O sermão do Domingo passado aqui.

sexta-feira, junho 01, 2012

Para o sermão do próximo Domingo - Jesus amaldiçoa uma figueira
Pode parecer escandaloso que, ao relacionar-se com uma planta, Jesus opte por uma lição espiritual em vez de preocupar-se ecologicamente. Mas é precisamente isso que Ele está a fazer: concentra-se nos alunos e não no material escolar. E então entendemos que o Mestre não está a ensinar sobre floresta mas sobre homens.