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És a coisa mais triste que existe
Conheci o Francisco Mendes Moreira em frente ao jardim do Palácio do Beau Séjour, na Estrada de Benfica, aí por volta de 2010. Foi amor à primeira vista: além da figurona que ele tem, falou-me dos discos que na altura andávamos a gravar na FlorCaveira e na hora prometi-lhe mais uns quantos. Na altura eu trabalhava na Igreja Baptista de São Domingos de Benfica e era, por isso, vizinho dele durante o expediente—ele trabalhava no Gabinete de Estudos Olisiponenses.
Eu ia ao encontro do Francisco com discos da nossa editora de Religião & Punk Rock e ele oferecia-me livros de poesia que tinha escrito, junto com pequenas pinturas que também fazia. Era difícil entender onde terminava o talento e interesse dele, tendo em conta que eu gostava de tudo o que me passava para as mãos. Os poemas eram encadernados com impecável espírito do it yourself e os quadros rapidamente ocuparam espaços da nossa casa.
Com o Francisco veio a Maria e vieram os meninos deles: em 2010 julgo que eram três mas depois ultrapassaram os nossos quatro. A minha amizade com o Francisco tornou-se a amizade dos Cavacos com os Moreiras. E a nossa casa naturalmente se tornou lugar dos poemas do Francisco, dos quadros do Francisco, do livro da Maria, e das carpintarias do Francisco (porque as manufacturas dele não paravam de se expandir). O nosso coração nunca mais se soltou dessa família linda e inacreditavelmente talentosa.
Quando o Francisco se dedicou a tempo inteiro à pintura, senti que eu tinha falhado. Explico: pensava em cravar-lhe uma capa para um disco há anos e nunca tinha chegado a fazê-lo. Agora que a obra dele era cada vez mais reconhecida, confesso que tive medo de passar pelo amigo impostor que se aproxima com pedidos apenas depois do reconhecimento público. Uma coisa podia redimir a minha falta de sentido de oportunidade: o próprio coração do Francisco.
Isto escrito assim parece quase um sermão, o que, juro, não é o meu objectivo. Mas a verdade é que quando admitimos o que desejamos junto de quem é generoso, ainda que nos timings típicos dos ardilosos, podemos obter a resposta própria de quem generoso é. Há uns meses pedi ao Francisco: “gravei um disco novo e sonho com ter a capa ilustrada por ti”. A resposta dele materializou-se na melhor capa que já tive.
Depois disso exagerei, claro. Cravei-o mais ainda: e se além da capa ele permitisse que o vídeo da primeira canção fosse ele no meio dos seus quadros? Sabia que ia ser o postal ilustrado mais bonito para a canção. Fui à casa da Família Moreira com o Joel Silva, a outra metade desta banda chamada A Cabeça de Diogo Alves, e o Newton Rodrigues, fotógrafo e diácono na Igreja da Lapa, captou a magia da oficina do Francisco. O resultado é o que vos mostro agora.
Depois de tantos anos a gravar discos, uns que parecem mais acessíveis do que outros, uns que parecem menos apressados do que outros, uns que parecem mais convencionais do que outros, faço por me render ao que se vai tornando evidente para mim: quero que as minhas palavras, quando usadas em música, sirvam para louvar o que amo. Também por causa disso, é um encontro precioso para mim que este disco novo, chamado “Ácido Prússico”, venha vestido assim pelo Francisco.